Olá!
Bem-vindo ao canal TheAsaGames! Eu sou o Asa e hoje vou falar de Inside, jogo lançado em 2016 pela
Playdead para PS4, Xbox One e PC. Ele é um jogo muito interessante, que
procura, antes de tudo, o poder da sugestão e da atmosfera para criar uma
experiência marcante e questionadora.
Inside é uma espécie de sequência
espiritual do jogo anterior da Playdead, chamado Limbo, e de que eu já falei no canal há um bom tempo. Eles
apresentam muitas similaridades, mas também algumas diferenças que ajudam a
entender um pouco as características mais marcantes de Inside e qual o efeito buscado pelos desenvolvedores desse jogo.
Inside,
assim como Limbo, é um jogo de puzzle em 2D, embora os planos de fundo
sejam em 3D. Em ambos os jogos, o jogador controla um menino explorando um
lugar misterioso e resolvendo quebra-cabeças que o impedem de prosseguir na sua
busca – aliás, uma busca muito pouco clara por sinal.
Em
Limbo, o visual era inteiro baseado
em sombras, e só se destacavam os olhos brilhantes do menino protagonista. Em Inside, os gráficos ficaram bem menos
conceituais, e adotaram uma estética cartunizada muito bonita, que ainda
prioriza os tons mais escuros e cinzentos, mas encontra espaço para vermelhos,
amarelos e outras cores que, no caso, funcionam para dar destaque e ajudar no design de cada cenário. Por exemplo, o
protagonista usa uma camiseta vermelha, uma cor que está ausente no resto do
jogo. Assim, o jogador sempre tem uma ideia precisa de onde o menino está,
enquanto isso só era possível pelos pontos brilhantes dos olhos em Limbo.
Em
termos de puzzles, Inside tem muitas das mesmas estruturas
de Limbo, embora um tanto mais
simplificadas. Foi bem menor o número de cenários que realmente me deixaram sem
saber o que fazer por um tempo. No geral, basta observar por alguns segundos e
a própria solução se abre para o jogador; é só entender as ferramentas que
estão disponíveis.
Com
isso, a experiência de jogar Inside é
muito mais dinâmica, com progresso acontecendo o tempo todo, o que
provavelmente é algo intencional, já que a variedade de cenários se dá de forma
bem mais dinâmica do que em Limbo.
Pelo menos de memória, me parece que Limbo
deixava o jogador preso em certas áreas por um bom tempo, enquanto Inside vai mostrando diversos panos de
fundo que deixam o jogador intrigado, mas logo eu volto a isso.
O
fato, então, é que um dos grandes atrativos de Limbo, os puzzles
complicados e brutais, perdem prioridade em Inside,
embora eles ainda existam e obedeçam a lógica e estética semelhantes às do jogo
anterior. O personagem ainda morre de forma brutal e cruel todas as vezes que
uma situação não é resolvida da forma correta, o que cria ainda o clima
sinistro que predominava em Limbo. É
só uma questão de que Inside
claramente prioriza dinamismo em detrimento do clima cerebral que permeava Limbo.
Existe
um motivo para isso. Em Limbo,
existia a impressão de que o mundo era cruel por natureza e, independentemente
de perseguidores específicos, a impressão que passava era de que o mundo era
indiferente e cruel com o garoto, mas que ele não era nenhuma criatura
particularmente notada e destacada.
Já em Inside, o protagonista é perseguido o
tempo todo, a sensação de urgência para se mover e escapar é constante, e por
isso o pouco tempo que se passa em cada puzzle
faz mais sentido com o sentimento que os desenvolvedores querem imprimir à
experiência. E isto é o mais importante em Inside:
um determinado sentimento que o jogo busca causar, o que faz do jogo algo muito
menos cerebral e mais intuitivo.
E isso nos leva, claro,
a querer entender o que é essa sensação, essa intuição e como ela é construída
pelo jogo. Alguns elementos centrais eu já mencionei: há um clima muito
opressor em volta do menino, que é marcado muito pela violência dos resultados
de fracasso nos puzzles: correr na
hora errada pode significar ser metralhado ou despedaçado por cachorros, ou até
ser explodido num bombardeio; já ser agarrado na água pode acabar com seu
protagonista se afogando diante dos seus olhos, enquanto ele luta desesperadamente
para sobreviver. É um jogo cruel na forma como lida com o protagonista.
Mas não é só isso:
durante o jogo, o protagonista encontra criaturas que parecem humanas, e que
estão trabalhando no estranho lugar em que se passa o jogo. E, para prosseguir,
muitas vezes é preciso operar um controlador de mentes para usar esses
trabalhadores para resolver puzzles,
não só para fazê-los carregar algo, mas também para oferecerem suas vidas para
você poder seguir em frente. Com isso, cria-se uma sensação muito interessante
no jogo, de que o menino controla vidas sem o menor cuidado ou remorso, da
mesma forma como o mundo não liga para ele, e da mesma forma como o jogador não
liga para o menino e o expõe a tantas situações perigosas para que ele,
jogador, possa ver tudo que o jogo reserva adiante.
Com isso, Inside coloca uma questão interessante,
perguntando ao jogador qual é o seu envolvimento ético no espetáculo que se
desenvolve no jogo. Será que não fazer parte do mundo em que o jogo se passa
exime o jogador da responsabilidade de usar tantas vidas para prosseguir, de
não ligar para os danos dos trabalhadores? Afinal, o jogo não funcionaria se
não houvesse jogador, e nada do que acontece no jogo estaria acontecendo se o
jogador não prosseguisse o tempo todo.
Em última instância, o
jogo acaba fazendo o jogador se perguntar sobre o compromisso ético de estar
envolvido em situações cruéis, ainda que de forma muito distante. Será que você
não tem responsabilidade quando compra algo de uma marca que usa trabalho
escravo? Será que rir de uma piada preconceituosa só para não deixar o piadista
sem jeito não é compactuar com o preconceito? Será que só pagar impostos é
suficiente, ou é preciso uma posição mais ativa diante dos problemas da sua
sociedade?
Inside
é só um jogo de puzzle, e nenhuma
dessas situações é diretamente colocada ao jogador. Mas isso é só porque tudo é
deliberadamente construído para não permitir absolutamente referencial nenhum
ao jogador. O cenário parece todos os lugares: uma fazenda, uma fábrica, o oceano,
um laboratório. Nada do que está acontecendo faz exatamente sentido. Tudo é uma
questão de sugestão constante de temas, situações e emoções.
Por conta disso, o jogo
é acusado de ser pretensioso, de ter uma história e um mundo que não fazem
sentido, e que não faz questão de se explicar para criar a impressão de ter
profundidade. Mas, a verdadeira questão que fica após finalizar Inside é justamente que não há
profundidade, mas isso é assim porque o jogo não direciona uma mensagem
necessariamente profunda, e sim um sentimento vago que busca fazer o jogador
olhar para si mesmo e se perguntar por que ele está fazendo tudo que está
fazendo, e se ele deveria mesmo estar fazendo.
Pelo menos desde The Stanley Parable, eu tenho visto com
alguma frequência a ideia de que a única saída para vencer um jogo é não jogar,
para se livrar do ciclo vicioso em que ele te coloca. Inside é mais um capítulo deste tema, buscando fazer o jogador se
questionar sobre qualquer situação em que ele se sinta desconfortável com a própria
posição. Qual é a sua parcela de culpa? Quais serão as consequências a longo
prazo? Será que uma violência ainda maior virá ao final, e talvez na direção
oposta?
Essas são as perguntas
fundamentais de Inside, enquanto o
jogador luta para avançar e vencer mais um jogo sobre o qual ele pouco
entenderá, mas sentirá um incômodo, e talvez esse incômodo lhe faça entender
coisas que estão para além do jogo. E era isso que eu queria dizer sobre Inside. Até a próxima análise!