sábado, 28 de janeiro de 2017

Inside - Pensando sobre o jogo


Olá! Bem-vindo ao canal TheAsaGames! Eu sou o Asa e hoje vou falar de Inside, jogo lançado em 2016 pela Playdead para PS4, Xbox One e PC. Ele é um jogo muito interessante, que procura, antes de tudo, o poder da sugestão e da atmosfera para criar uma experiência marcante e questionadora.

Inside é uma espécie de sequência espiritual do jogo anterior da Playdead, chamado Limbo, e de que eu já falei no canal há um bom tempo. Eles apresentam muitas similaridades, mas também algumas diferenças que ajudam a entender um pouco as características mais marcantes de Inside e qual o efeito buscado pelos desenvolvedores desse jogo.

Inside, assim como Limbo, é um jogo de puzzle em 2D, embora os planos de fundo sejam em 3D. Em ambos os jogos, o jogador controla um menino explorando um lugar misterioso e resolvendo quebra-cabeças que o impedem de prosseguir na sua busca – aliás, uma busca muito pouco clara por sinal.

Em Limbo, o visual era inteiro baseado em sombras, e só se destacavam os olhos brilhantes do menino protagonista. Em Inside, os gráficos ficaram bem menos conceituais, e adotaram uma estética cartunizada muito bonita, que ainda prioriza os tons mais escuros e cinzentos, mas encontra espaço para vermelhos, amarelos e outras cores que, no caso, funcionam para dar destaque e ajudar no design de cada cenário. Por exemplo, o protagonista usa uma camiseta vermelha, uma cor que está ausente no resto do jogo. Assim, o jogador sempre tem uma ideia precisa de onde o menino está, enquanto isso só era possível pelos pontos brilhantes dos olhos em Limbo.

Em termos de puzzles, Inside tem muitas das mesmas estruturas de Limbo, embora um tanto mais simplificadas. Foi bem menor o número de cenários que realmente me deixaram sem saber o que fazer por um tempo. No geral, basta observar por alguns segundos e a própria solução se abre para o jogador; é só entender as ferramentas que estão disponíveis.

Com isso, a experiência de jogar Inside é muito mais dinâmica, com progresso acontecendo o tempo todo, o que provavelmente é algo intencional, já que a variedade de cenários se dá de forma bem mais dinâmica do que em Limbo. Pelo menos de memória, me parece que Limbo deixava o jogador preso em certas áreas por um bom tempo, enquanto Inside vai mostrando diversos panos de fundo que deixam o jogador intrigado, mas logo eu volto a isso.

O fato, então, é que um dos grandes atrativos de Limbo, os puzzles complicados e brutais, perdem prioridade em Inside, embora eles ainda existam e obedeçam a lógica e estética semelhantes às do jogo anterior. O personagem ainda morre de forma brutal e cruel todas as vezes que uma situação não é resolvida da forma correta, o que cria ainda o clima sinistro que predominava em Limbo. É só uma questão de que Inside claramente prioriza dinamismo em detrimento do clima cerebral que permeava Limbo.

Existe um motivo para isso. Em Limbo, existia a impressão de que o mundo era cruel por natureza e, independentemente de perseguidores específicos, a impressão que passava era de que o mundo era indiferente e cruel com o garoto, mas que ele não era nenhuma criatura particularmente notada e destacada.

Já em Inside, o protagonista é perseguido o tempo todo, a sensação de urgência para se mover e escapar é constante, e por isso o pouco tempo que se passa em cada puzzle faz mais sentido com o sentimento que os desenvolvedores querem imprimir à experiência. E isto é o mais importante em Inside: um determinado sentimento que o jogo busca causar, o que faz do jogo algo muito menos cerebral e mais intuitivo.

E isso nos leva, claro, a querer entender o que é essa sensação, essa intuição e como ela é construída pelo jogo. Alguns elementos centrais eu já mencionei: há um clima muito opressor em volta do menino, que é marcado muito pela violência dos resultados de fracasso nos puzzles: correr na hora errada pode significar ser metralhado ou despedaçado por cachorros, ou até ser explodido num bombardeio; já ser agarrado na água pode acabar com seu protagonista se afogando diante dos seus olhos, enquanto ele luta desesperadamente para sobreviver. É um jogo cruel na forma como lida com o protagonista.

Mas não é só isso: durante o jogo, o protagonista encontra criaturas que parecem humanas, e que estão trabalhando no estranho lugar em que se passa o jogo. E, para prosseguir, muitas vezes é preciso operar um controlador de mentes para usar esses trabalhadores para resolver puzzles, não só para fazê-los carregar algo, mas também para oferecerem suas vidas para você poder seguir em frente. Com isso, cria-se uma sensação muito interessante no jogo, de que o menino controla vidas sem o menor cuidado ou remorso, da mesma forma como o mundo não liga para ele, e da mesma forma como o jogador não liga para o menino e o expõe a tantas situações perigosas para que ele, jogador, possa ver tudo que o jogo reserva adiante.

Com isso, Inside coloca uma questão interessante, perguntando ao jogador qual é o seu envolvimento ético no espetáculo que se desenvolve no jogo. Será que não fazer parte do mundo em que o jogo se passa exime o jogador da responsabilidade de usar tantas vidas para prosseguir, de não ligar para os danos dos trabalhadores? Afinal, o jogo não funcionaria se não houvesse jogador, e nada do que acontece no jogo estaria acontecendo se o jogador não prosseguisse o tempo todo.

Em última instância, o jogo acaba fazendo o jogador se perguntar sobre o compromisso ético de estar envolvido em situações cruéis, ainda que de forma muito distante. Será que você não tem responsabilidade quando compra algo de uma marca que usa trabalho escravo? Será que rir de uma piada preconceituosa só para não deixar o piadista sem jeito não é compactuar com o preconceito? Será que só pagar impostos é suficiente, ou é preciso uma posição mais ativa diante dos problemas da sua sociedade?

Inside é só um jogo de puzzle, e nenhuma dessas situações é diretamente colocada ao jogador. Mas isso é só porque tudo é deliberadamente construído para não permitir absolutamente referencial nenhum ao jogador. O cenário parece todos os lugares: uma fazenda, uma fábrica, o oceano, um laboratório. Nada do que está acontecendo faz exatamente sentido. Tudo é uma questão de sugestão constante de temas, situações e emoções.

Por conta disso, o jogo é acusado de ser pretensioso, de ter uma história e um mundo que não fazem sentido, e que não faz questão de se explicar para criar a impressão de ter profundidade. Mas, a verdadeira questão que fica após finalizar Inside é justamente que não há profundidade, mas isso é assim porque o jogo não direciona uma mensagem necessariamente profunda, e sim um sentimento vago que busca fazer o jogador olhar para si mesmo e se perguntar por que ele está fazendo tudo que está fazendo, e se ele deveria mesmo estar fazendo.

Pelo menos desde The Stanley Parable, eu tenho visto com alguma frequência a ideia de que a única saída para vencer um jogo é não jogar, para se livrar do ciclo vicioso em que ele te coloca. Inside é mais um capítulo deste tema, buscando fazer o jogador se questionar sobre qualquer situação em que ele se sinta desconfortável com a própria posição. Qual é a sua parcela de culpa? Quais serão as consequências a longo prazo? Será que uma violência ainda maior virá ao final, e talvez na direção oposta?

Essas são as perguntas fundamentais de Inside, enquanto o jogador luta para avançar e vencer mais um jogo sobre o qual ele pouco entenderá, mas sentirá um incômodo, e talvez esse incômodo lhe faça entender coisas que estão para além do jogo. E era isso que eu queria dizer sobre Inside. Até a próxima análise!

Nenhum comentário:

Postar um comentário