sábado, 19 de maio de 2018

Batman: The Telltale Series - Pensando sobre o jogo




Olá! Hoje vou falar de Batman: The Telltale Series, jogo da Telltale lançado em 2016 para PC, Xbox 360 e One, PS3 e 4 e para Switch em 2017.

Batman da Telltale é um jogo relativamente modesto nas suas ambições, mas que consegue acrescentar alguns elementos interessantes, que podem funcionar eventualmente como trampolim para mecânicas mais elaboradas em futuros jogos do homem-morcego.

O jogo retoma em muito aquilo que já é considerado como o estilo da Telltale: mecanicamente, ele gira em torno de tomadas de decisão, especialmente no tocante a diálogos, e de alguns elementos de ação, estruturados no formato de quick time events. Porém, esses elementos são modificados para se encaixar no mundo do Batman de uma forma interessante.

Isso fica extremamente claro na forma como o jogo aborda os combates: há uma série de cenas em que o jogo apenas pede que o jogador cumpra determinados comandos em momentos específicos, com relativamente pouco peso para falhas, pelo menos no longo prazo. Porém, há algumas cenas em que o jogo dá o tempo para o jogador escolher como proceder no combate, ou seja, é possível elaborar um plano de ataque, indicando como atacar cada inimigo.

É claro que, no fundo, não há muita diferença entre as opções possíveis, mas a sensação de acompanhar o Batman planejando suas ações e interferir nesse planejamento acabam sendo fundamentais no retrato de herói mais próximo de sua essência. Anos de experiência com jogos como os da Rocksteady, por exemplo, nos ensinaram que a proeza no combate é suficiente para o Batman sobreviver a qualquer enrascada, mas a série da Telltale coloca ênfase no lado estrategista do herói, o que é uma abordagem interessante e realista, que cabe bem ao personagem e que, aliás, já havia sido sugerida pela escolha dos itens no jogo de Super Nintendo.

Parte dessas mecânicas são executadas também nos trechos em que o Batman age como um detetive. O jogador precisa saber relacionar objetos, e o Batman, por sua vez, executa o raciocínio que o leva a entender o próximo passo a seguir. É uma ênfase interessante, mas relativamente próxima a outras tentativas de outros jogos, como os da série Arkham.

Na verdade, eu acho que os jogos do Batman poderiam receber perfeitamente mecânicas de detetive como as da série Sherlock Holmes, em que há múltiplos elementos a combinar e múltiplas interpretações a fazer, e o jogador acaba sendo responsável por muitas das análises e interpretações que guiam o protagonista. Tanto o jogo da Telltale quanto os da série Arkham investem nesse sentido, mas acabam sendo rasos e permitindo muita tentativa e erro num trabalho que deveria ser um pouco mais refinado.

Por fim, cabe falar dos diálogos e da história, que são considerados o foco dos jogos da Telltale. Nesses dois planos, o jogo oferece coisas interessantes e relativamente novas. Em termos de história, o jogo oferece um distanciamento essencial da narrativa canônica do Batman, ao colocar a família Wayne como criminosa, em vez da versão idealizada que guia os atos vingativos do protagonista.

Transformando os maiores bastiões da moralidade de Gotham em criminosos, o jogo acrescenta profundidade sem mover as peças principais do mundo do Batman: por um lado, o jogo oferece um comentário sutil sobre grandes fortunas tradicionalmente advirem de momentos-chave em que a lei foi burlada; e, por outro, o compromisso de Bruce Wayne com Gotham vai além do impulso de evitar que outras pessoas sejam mortas como seus pais, mas também se trata do desejo de reconstruir a cidade que seus pais ajudaram a deteriorar.

Essa abordagem relativamente realista e que busca comentar um pouco sobre o mundo real casa bem também com o momento em que o jogo é centrado: o início das grandes aventuras do Batman, quando o foco ainda não estava nos supervilões contra os quais o morcego tanto batalha depois. Mesmo as atitudes dos supervilões que chegam a aparecer no jogo estão voltadas a causar efeitos específicos nas estruturas da sociedade de Gotham, como a queda dos mais ricos ou dos corruptos, ou o questionamento sobre como os doentes mentais são tratados na cidade.

Em grande medida, é um jogo direcionado a comentar sobre como uma sociedade precisa olhar para seu passado para entender os desafios e problemas envolvidos para moldar seu futuro. E, num espelhamento interessante, isso se reflete no protagonista na questão de quem é a família Wayne e na ação do jogador de decidir quem é Bruce Wayne e como ele se relaciona com o Batman.

O jogador pode decidir essa identidade de Bruce Wayne pelos diálogos com os diversos personagens que habitam Gotham, e que moldam como seus amigos e inimigos o veem, e mesmo a população inteira da cidade, que acompanha as notícias e declarações do bilionário. O jogo faz um bom trabalho nisso, colocando diversas situações em que as escolhas são difíceis e capazes de gerar repercussões em momentos relativamente inesperados na história.

Além disso, o jogo permite escolher como abordar certas situações, ou como Bruce Wayne, ou como Batman. Isso dá espaço para a personagem ser valorizado e mostrar sua relação com os personagens mais famosos do seu universo de uma forma diferente e interessante. Normalmente, muitos consideram a persona Bruce Wayne como apenas uma fachada para o Batman. No jogo da Telltale, porém, Bruce Wayne e Batman dividem o holofote igualmente, e muitos problemas do herói só podem ser resolvidos pelo bilionário, e muitos dos problemas de Bruce passam pelas mãos do morcego.

Assim, a série Batman da Telltale cria um universo com os pés mais no chão, que busca comentar um pouco sobre o mundo real, enquanto propõe coisas novas para o universo do Batman em jogos: o foco maior em planejamento e no trabalho de detetive aponta para alternativas que podem ser trabalhadas de forma mais profunda em jogos posteriores, ou mesmo de outro estúdio. E os diálogos chamam a atenção para o fato de que é possível construir um jogo em tornos dos personagens, fugindo um pouco da tradição focada em ação e combates.

E era isso que eu queria falar sobre Batman: The Telltale Series. Até a próxima análise!