Olá!
Eu sou o Asa e hoje eu vou falar de Dark
Souls II, jogo desenvolvido pela FROM Software e publicado pela Bandai
Namco em 2014 para PC, PS3 e Xbox 360. A versão que eu joguei e que será
comentada é a final, com todos os DLCs e uma série de mudanças, batizada de Scholar of the first sin, lançada em
2015 para as mesmas plataformas, e também para PS4 e Xbox One. Como eu passei
só por essa versão, não espere muitas comparações com a original; eu vou
realmente me concentrar na forma definitiva que o jogo assumiu com a
reformulação de 2015.
Dark Souls 2 é possivelmente o jogo mais
comentado e discutido na internet. Ou, pelo menos, é o mais comentado e
discutido com exceção daqueles clássicos supremos que guardam seu lugar um
pouco além da própria história. Eu acredito até que ele seja mais discutido do
que o próprio Dark Souls, o qual
muitas pessoas passaram a entender melhor por conta das comparações incessantes
entre ele e a sequência.
O
fato é que há diversas diferenças em relação ao jogo original da franquia e
muitos fãs antigos criam inúmeros ensaios para mostrar essas diferenças, e
mostrar como o original seria superior. Atualmente, a gente tem finalmente
também os ensaios em contrário, aqueles que explicam como Dark Souls 2 talvez seja superior ou, pelo menos, diferente do seu
antecessor.
Muitos
youtubers, especialmente os estrangeiros, já discutiram Dark Souls 2 em detalhe, a ponto de restar muito pouco a dizer: o
Matthewmatosis tem um vídeo de quase 50 minutos falando das mudanças do jogo em
relação ao original, o Joseph Anderson tem mais de uma hora e meia de
comentário sobre as diversas partes do jogo, e esses dois são só exemplos.
Estou
falando tudo isso só para fundamentar a minha decisão de não ficar repetindo
muito o que já foi falado, ou seja, este é mais um vídeo como os que eu fiz
sobre Mega man ou Cuphead, em que eu mais tento dar a
minha contribuição ao debate do que repetir o que já se conhece bem sobre o
jogo.
Dito isso, eu tenho
mais dois avisos: o primeiro é que eu recomendo muito ver o meu vídeo sobre o
primeiro Dark Souls, porque eu vou
fazer algumas referências ao jogo e a certas interpretações que eu fiz lá; e o
segundo é que este vídeo vai spoilar
livremente Dark Souls 2, bem como seu
antecessor. Como quando eu falei sobre o primeiro Dark Souls, este é um vídeo para quem já conhece o jogo em detalhe.
Se, depois de saber tudo isso, você quiser continuar, vamos lá.
Acho que a primeira e
principal ideia que eu preciso indicar é que Dark Souls 2 tem claramente um tema que ele persegue e que, talvez
até sem querer, ele acaba sempre retomando. É, curiosamente, uma obra de uma
coesão estranha, porque, quando eu uso esse termo, eu normalmente quero dizer
algo positivo, mas a verdade é que a coesão desse jogo mais o prejudica do que
o favorece.
E esse tema é o do
esquecimento, da perda, da quebra de ligações, da falta de nexo, ou, em uma
palavra: alienação. Esse termo é muito carregado politicamente, mas vamos
usá-lo no seu sentido original e mais amplo, que é o do processo em que se
perde o conhecimento sobre um objeto, sobre o seu passado, sobre o que está
ligado a ele no geral.
Falar que isso está em Dark Souls 2 é declarar o óbvio, porque
a cutscene inicial já trata desse
assunto, falando que a maldição dos mortos-vivos apaga lentamente a memória,
até que só reste um hollow, uma casca
no lugar da pessoa que um dia ocupou aquele corpo.
Mas, esse tema vai
muito além disso dentro do jogo. Ainda falando da história, a alienação não se
dá apenas em relação ao passado dos amaldiçoados, mas também com relação ao
presente e ao futuro: a trajetória do protagonista é mencionada constantemente
como algo que nem ele mesmo entende, suas motivações não são claras, apenas um
vago desejo de se livrar da maldição. Ou seja, o protagonista está alienado em
relação ao passado e ao presente. Se ele não tem essas informações, como se
pode saber quem é ele?
Com o tempo, analisando
as decisões de design, o jogador
finalmente entende quem é esse personagem: é ele mesmo, o jogador. Afinal, a
única diferença entre esse personagem vagando por Drangleic e um hollow qualquer é que há alguém o
controlando do lado de fora; a única força real carregando esse personagem é o
seu desejo, como jogador, de prosseguir no jogo, ver coisas novas, vencer novos
desafios.
Neste ponto, cabe uma
rápida comparação com Bloodborne, em
que muitas das coisas são obscuras a ponto de dar uma impressão semelhante ao
jogador. A diferença é que, em Bloodborne,
há, por um lado, uma motivação do personagem que simplesmente o jogo não
esclarece, mas que também não diz que não existe; e, por outro lado, há
criaturas cuja ação estão além da compreensão do personagem que nós
acompanhamos, mas que pode ser intuída conforme se progride no jogo. E, vale
dizer, desde o início a missão de Bloodborne
está clara: conseguir sangue pálido e acabar com o pesadelo.
O mesmo vale para o
primeiro Dark Souls: embora o jogador
possa se sentir um pouco sem direcionamento, há uma série de NPCs que dão
direções e explicações muito claras e que oferecem objetivos muito claros, que
servem de motivação ou de norte. Dark
Souls 2 não só não costuma oferecer direcionamentos muito claros, como
também não explica a razão dos direcionamentos que dá e, na imensa maioria dos
casos, só diz que o protagonista não entende o que está fazendo.
Sendo assim, no fundo,
a história de Dark Souls 2 não é a
história de um morto-vivo tentando reverter sua maldição e talvez salvar
Drangleic e o resto do mundo; é, sim, a história de um jogador que colocou Dark Souls 2 para rodar e quer se divertir
com mais essa experiência, ser desafiado, ver o que há adiante, e por aí vai.
Do jeito que eu estou
falando, deve estar parecendo que isso é uma crítica, mas, na verdade, não é –
pelo menos, não necessariamente. É apenas uma mudança drástica de foco. Os
jogos da série até então, e até Bloodborne,
valorizam muito o sentimento de uma missão, o entendimento do que está
acontecendo naquele universo, a postura de detetive, ou seja, os jogos da FROM
Software buscam um sentido de imersão que simplesmente não está presente em Dark Souls 2, e talvez por escolha
própria.
Um dos grandes desafios
ao conceber uma sequência, ainda mais se o encarregado de dirigir o jogo não é
o mesmo do antecessor, é entender o que faz parte da base da série, o que é
essencial, qual é a sua identidade. Uma das estratégias mais válidas para fazer
isso é ver o que o público acha, o que ele valoriza, o que o marcou na primeira
experiência. E, se alguém pesquisasse sobre Dark
Souls antes de fazer uma sequência, provavelmente o que mais ouviria seria
o apreço pela dificuldade, a diversão dos combates, o terror das invasões, etc.
É claro que aquele que
ouvir mais atentamente também vai ficar sabendo do apreço pelo level design complexo e a coerência do
universo, mas esses argumentos, embora já existissem antes de Dark Souls 2, viraram o centro da
conversa principalmente após o lançamento de Dark Souls 2, porque esse jogo não alcançava o mesmo nível dos
jogos anteriores nesses quesitos.
Sendo o combate o
centro da conversa, a FROM resolveu centralizar a experiência da sequência
nele, incorporando elementos temáticos e narrativos apenas como acessórios na
construção do mundo, mas sem a centralidade que eles antes ocupavam. É claro
que eu estou só especulando aqui, baseado no meu conhecimento sobre a
comunidade e sobre aquilo que o jogo apresenta. Talvez eu esteja atirando no
escuro, mas o fato é que, em Dark Souls 2,
o combate parece ser o centro, e as coisas são construídas em volta dele.
Alguém pode argumentar
que o combate sempre foi o centro da série, mas eu diria que não
necessariamente. O combate na série Souls
é uma ferramenta poderosa para criar a experiência geral, que é transitar por
um mundo perigoso e hostil, em que quase tudo está contra você, mas no qual
você tem as ferramentas para perseverar. Mas, nesse sentido, tão importante
quanto o combate é o level design
complexo, que te dá aquela sensação de um mundo enorme e difícil de entender; a
história que coloca grandes perigos no seu caminho; e mesmo os cenários, que
possuem beleza e grandiosidade, como se você estivesse num lugar majestoso
demais para você.
Em grande medida, acho
que desses três elementos, level design,
história e cenários, Dark Souls 2 foi
capaz de manter o nível apenas nos cenários, e, pelo menos no quesito estético,
certamente superou o original. Eu fico especialmente impressionado com as
paisagens desse jogo, com a imensidão e o contraste de cores que muitas das
localidades possuem.
Falando um pouco em
detalhe desses três elementos, eu acredito dê para ficar claro o quanto partes
que antes funcionavam de forma coesa e com igual importância nos jogos
anteriores foram rebaixadas em favor da prática do combate, que se tornou rei e
subjugou os outros elementos, de um jeito que Dark Souls 2 acaba não sendo um jogo ruim, mas tem um forte tom
artificial, alienado, em que apenas o quê importa, e não o por quê, ou o para
quê, o quando, o onde, etc.
O primeiro elemento é o
level design, e esse talvez seja a
clássica crítica que se faz ao jogo: em sua imensa maioria, o level design de Dark Souls 2 é linear, com apenas algumas salas para explorar, em
vez do design complexo do primeiro
jogo. Exceções a isso se dão apenas nos dois primeiros DLCs e em cenários como Gutter e Lost Bastille.
Se pensarmos nas
mudanças de prioridade da série, acaba fazendo muito sentido: Dark Souls 2 não incentiva tanto
exploração, e sim combates, especialmente combates contra grupos. Levando isso
em consideração, o level design foi
simplificado para funcionar quase como uma maratona, porque enfrentar tantos
inimigos talvez fosse cansativo demais para depois ficar explorando o mapa e
correndo o risco de encontrar mais coisas. Quase todas as fases de Dark Souls 2 dão aquela impressão de que
o objetivo final não era chegar em algum lugar específico, mas sim sobreviver
até certo ponto. E, como a caminhada é extenuante, há um excesso de bonfires, com todas permitindo fast travel; assim você não precisa
repetir a maratona.
Esse sentimento de
sobrevivência é bem simbolizado mesmo nos combates individuais. Dark Souls 2 tirou a centralidade do
sistema de estus flasks, que fornecia
uma quantidade fixa de itens de cura, em favor das lifegems, que podem ser compradas livremente. Além disso, o
processo de usar um item de cura se tornou extremamente lento, a ponto de se
tornar bem pouco viável na maioria das situações de combate. Com isso, a
filosofia do combate do jogo é tratar cada luta como um pequeno desafio, que o
jogador precisa superar e que é, em si, um potencial momento de derrota.
O jogador precisa
aprender a lidar com muitos inimigos simultâneos, às vezes até muitos inimigos
fortes ou com métodos de ataque diferentes. Se ele consegue vencer, ele tem o
direito de se curar e passar ao próximo desafio. Se ele passar por vários
desafios, ele ganha direito a ativar o checkpoint.
Além disso, mesmo após
ativar a animação de ataque, os inimigos conseguem seguir a movimentação do
jogador e atingi-lo se ele não desviar no momento exatíssimo, com o mesmo
valendo para flechas e magias. Com isso, mesmo se a tradicional técnica de
correr dos inimigos for usada, ela demandará uma precisão bem maior, e talvez até
investimento em Adaptabilidade, que é o atributo que regula os frames em que o personagem está
invulnerável ao rolar.
A ideia é, então, que Dark Souls 2 quer que você lute sempre com
os inimigos que colocou no cenário, por isso os cenários não apresentam tantos
caminhos alternativos, e os inimigos acabam sendo muito bons em te seguir e te
acertar quando você tenta correr. Por conta disso, você tem um level design simplificado, apenas um
conjunto de corredores e arenas, com a eventual armadilha aqui e ali para te
pegar de surpresa e te deixar em pânico antes do combate em si começar.
Passando agora aos
cenários, a gente tem uma mudança de tentar criar um universo orgânico para
criar um universo simplesmente variado, que oferece diversidade de localidades
ao jogador, mas sem pensar que elas deveriam fazer algum sentido entre si.
Nesse aspecto, há uma semelhança com o princípio de Demon’s Souls, que propõe cenários radicalmente distintos, mas, em Demon’s Souls, os cenários são
totalmente separados, sem nada que especifique a distância a que eles estão um
do outro e, dentro dos cenários em si, há uma coerência. Todas as partes de Valley of Defilement são coerentes, por
exemplo.
Em Dark Souls 2, o jogador pode chegar a localidades totalmente
distintas num piscar de olhos, porque, como o primeiro Dark Souls, a ideia é que você vá de uma área a outra a pé, e não
que se teletransporte a partir da área central, como é o caso em Demon’s Souls. Com isso, certas
transições fazem muito pouco sentido, o que arruína significativamente a
imersão que o jogo poderia criar.
Pensando em tudo que eu
falei até agora, Dark Souls 2 aparece
como um jogo baseado em núcleos, que se propõem como situações interessantes
para o jogador interagir com o sistema de combate. Tematicamente há muitas
semelhanças com os outros jogos da série, mas, enquanto os outros pensam muito
mais em termos gerais, da experiência como um todo, Dark Souls 2 se concentra muito mais no momento, nas situações
individuais.
E, para essas situações
individuais, o combate foi significativamente expandido, oferecendo muito mais
diversidade de opções de builds, um
monte de magias novas, especialmente as magias negras, chamadas hexes, e as pyromancies. Além disso, os anéis foram expandidos, com o
personagem podendo usar até quatro de uma vez. A quantidade de elementos que se
pode atribuir a uma arma parece ultrapassar até o número de opções que Demon’s Souls oferecia, e é até possível
usar armas nas duas mãos agora.
Tudo isso torna o
combate de Dark Souls 2 muito mais
interessante do que o primeiro. Alguém pode argumentar que os inimigos que se
está enfrentando são menos variados e interessantes, mas, da parte do jogador,
nunca foi tão fácil criar situações diferentes e interessantes de combate,
testar coisas novas e exercitar suas habilidades até aprender a tirar o máximo
que o sistema de combate te permite.
Mesmo o problema da
inteligência artificial com relação a flechas foi atenuado, com os inimigos
partindo para o ataque se forem feridos a uma distância longa. Com o arco e o
anel certos, ainda é possível explorar essa falha, mas ela é bem menos sensível
do que era no primeiro Dark Souls. Se
eu tivesse que apontar dois problemas no combate desse jogo, seriam apenas os
agarrões dos inimigos, que conseguem acertar muito mais do que deveriam, o que
é um problema até sério, porque geralmente esses ataques causam um dano muito
grande.
O outro problema é o
fato de que os inimigos conseguem atacar por dentro do inimigo que está na
frente deles. Até então, isso não era tão perceptível, mas, como em Dark Souls 2 há muitos grupos de
inimigos e é um raciocínio comum querer atraí-los para um corredor e matá-los
um por vez, acaba ficando frustrante levar dano do inimigo que está atrás de um
outro, e cuja espada passa direto pelo companheiro, só para te acertar.
Assim, Dark Souls 2 é um jogo muito competente
no que ele se propõe a fazer, que é criar essas situações de combate. Ele te dá
as ferramentas certas, te oferece cenários curiosos e interessantes para travar
combates, e os inimigos oferecem desafios diferentes do que se enfrentou até
então e, mesmo que o design deles
seja semelhante, eles possuem diversidade suficiente para ser necessário
estudar estratégias e opções.
É por isso que é tão
comum os críticos de Dark Souls 2
falarem que o jogo é bom, mas não é um bom Dark
Souls. Não há como negar que ele seja competente, talvez o mais competente
da série, mas o fato de que ele destaca o combate e faz com que o resto se
submeta a ele acaba fazendo dele uma obra muito menos ambiciosa e interessante
do que o resto dos jogos da série.
O resultado dessa
autoconsciência de que Dark Souls 2 é
um jogo e desse ato de priorizar o aspecto mais fundamental da jogabilidade é
que o jogo se torna artificial e estranhamente desencantado, e nada deixa isso
mais claro do que a própria história do jogo. Como eu falei, a ideia de que as
motivações passadas e futuras do protagonista não são claras sequer a ele mesmo
já explicita que o jogo não se importa muito com o universo que ele cria. Mas,
a coisa vai muito além, especialmente no tocante ao conceito de ciclos.
Desde o início do jogo,
Dark Souls 2 deixa bem claro que se
passa no mesmo mundo que seu antecessor, mas muito tempo depois. Nesse meio
tempo, a mesma história tende a se repetir inúmeras vezes: o fogo começa a se
apagar, a maldição dos mortos-vivos se intensifica, e alguém precisa se oferecer
como combustível para que a chama volte ao normal, por apenas um curto tempo
que seja. E assim se passam milhares de anos, com as mesmas coisas sempre
acontecendo.
Há um grande esforço
para simbolizar essa repetição, com direito ao retorno das almas dos principais
chefes de Dark Souls atreladas aos
principais chefes de Dark Souls 2,
mesmo sem uma explicação muito convincente para isso; os quatro reis que
supostamente poderiam se oferecer em sacrifício à chama são todos acompanhados
por uma mulher criada pela escuridão, embora cada uma delas aja diferentemente
em relação a esse sacrifício; muitas das magias e dos itens presentes em Dark Souls reaparecem na sequência, mas
sendo atribuídos a outras pessoas, como se o conhecimento original deles
tivesse se perdido e eles tivessem que ser reinventados do zero; diversos NPCs
falam que Drangleic é só um reino que veio depois de muitos outros surgirem e
desaparecerem, etc.
Tudo isso passa uma
sensação de inevitabilidade de lutar com o destino, ou melhor, da inutilidade
da ação do protagonista, o que fica ainda mais claro quando a gente pensa que o
primeiro Dark Souls tinha uma escolha
em seu final, e que essa escolha é completamente ignorada em Dark Souls 2. Ou o jogo considera o
final de se sacrificar à chama como canônico, o que esvazia as opções do
primeiro, ou indica que, mesmo que você tenha deixado a chama morrer, algum
outro morto-vivo se sacrificou por ela e você, como senhor da escuridão, não
fez nada para impedir.
A ideia da
inevitabilidade era tão grande que, em sua versão original, a única opção de
final de Dark Souls 2 era se
sacrificar pela chama. Na versão Scholar
of the first sin, você pode se recusar a isso, mas, em vez do final do
senhor da escuridão, a gente tem um discurso vago sobre a busca por uma
terceira via que, até onde se sabe, nada no jogo substancia, o que
provavelmente indica que é uma busca vã.
Algumas pessoas
interpretam esse tom de inevitabilidade do jogo como uma deixa para uma
continuação da série e, como se sabe, Dark
Souls 3 não demorou muito a ser lançado. Afinal, se há sempre ciclos, há
infinitos Dark Souls possíveis. Mas,
considerando o quanto esse jogo deixa claro para si mesmo e para o jogador que
ele é um jogo, um objeto artificial feito para você se divertir, eu interpreto a
ideia dos ciclos mais como uma forma de incorporar a mecânica de New Game Plus à própria história.
Afinal, assim que você termina um ciclo, você já pode começar o próximo.
Uma das coisas que mais
me faz pensar isso é o fato de que Dark
Souls 2 oferece diferenças interessantes quando se passa para um novo New Game Plus, com novos inimigos, itens
para comprar e ganhar, ou seja, há um esforço para que o jogador trate essa
nova trajetória como igual, mas um pouco diferente, ou seja, um novo ciclo. E,
a partir disso, a história do jogo foi repensada para incorporar mais um
elemento pertencente à jogabilidade.
E não é só nesse caso
que isso acontece: um dos temas mais frequentes no jogo é a ideia de buscar
sofrimento. Pelo menos dois personagens afirmam diretamente que isso é
essencial para encontrar as respostas que o protagonista procura, se é que ele
está mesmo procurando algo. Note que esses personagens não falam em buscar
desafio, poder ou conhecimento. Eles falam claramente em sofrimento. Essa ideia
de busca a dor tem um paralelo direto com a ideia de que a série é difícil,
porque nada mais no universo de Dark
Souls justifica esse impulso.
Pelo contrário: morrer
no jogo faz você perder suas almas, o que limita seu potencial para deixar seu
personagem mais forte e, a cada vez que você morre na forma hollow, você perde mais do seu HP máximo.
Ou seja, buscar sofrimento efetivamente limita seu poder, não te torna mais
forte. E você só progride no jogo por vencer, e não por sofrer.
Sendo assim, sempre me
pareceu que cada fala desse jogo não era direcionada ao morto-vivo circulando
por Drangleic, e sim para uma pessoa no mundo real, segurando um controle.
Mesmo aqueles itens de Dark Souls que
reaparecem na sequência são cheios de comentários que não fazem nenhum sentido
para quem não conhece o original, e são decididamente só os desenvolvedores
dando uma piscadela aos jogadores fiéis da série.
E assim é Dark Souls 2: um jogo que talvez tenha
tomado consciência de si mesmo num nível tal que escolheu abandonar sua imersão
e fazer apenas um jogo divertido, com um combate evoluído, mas num mundo decididamente
menos interessante, tão desgastado quanto a chama primordial. Em vez de se
sacrificar para fazer essa chama brilhar de novo, os desenvolvedores da FROM
Software preferiram apelar diretamente ao jogador e criar algo que não existe
num mundo paralelo, com significações próprias e ambivalências que te fazem
pensar, e sim uma simulação de combate divertida que recomeça toda vez que você
liga seu console ou computador e coloca o jogo para rodar.
Talvez isso não seja um
problema para aquele jogador que veio atrás da série por conta da lenda de sua
dificuldade, dos desafios, da comunidade e das múltiplas opções de build. Mas, certamente resultou num jogo
bem distinto dos universos complexos que a série tinha estabelecido até então,
e que retornou com toda a força em Bloodborne.
E era isso que eu queria dizer sobre Dark
Souls 2. Até a próxima análise!
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