segunda-feira, 29 de janeiro de 2018

Finding Paradise - Pensando sobre o jogo



Olá! Eu sou o Asa e hoje eu quero falar de Finding Paradise, jogo desenvolvido pela Freebird Games, lançado no finalzinho do ano passado para PC. Finding Paradise é o terceiro jogo da Freebird que se passa num mesmo universo, sendo os dois primeiros To the moon e A bird story, de que eu já falei aqui no canal. Por isso, e para evitar me repetir, eu recomendo a todos que se interessarem que vejam esses dois vídeos, principalmente aquele dedicado a To the moon, que é o que mais está ligado a Finding Paradise em termos estruturais.

A bird story, embora seja protagonizado por um dos personagens absolutamente centrais a Finding Paradise, é uma versão simplificada do universo e das mecânicas dos jogos da Freebird; por isso, a ligação dele se dá muito mais em termos de enredo. To the moon consegue se conectar a Finding Paradise tanto em termos de enredo, quanto de mecânicas, embora, em grande medida, essa comparação seja um pouco cruel a Finding Paradise, mas disso eu vou falar em mais detalhe depois.

Como To the moon, Finding Paradise é um jogo de aventura bem simples, em que o jogador controla os doutores Neil Watts e Eva Rosalene, que trabalham numa empresa que permite alterar memórias de pacientes à beira da morte, fazendo com que, em suas cabeças, eles consigam realizar algum sonho que deixaram para trás ao longo da vida.

O procedimento para isso ainda é viajar pelas memórias do paciente, criando um flashback dentro do outro, partindo da memória mais recente, até a mais antiga. Para isso, eles se valem de objetos que foram importantes em múltiplos momentos da vida do paciente, usando-os como âncoras para pular de uma memória para outra. Quando os doutores entendem o que é preciso mudar para fazer o sonho escolhido se realizar, eles vão alterando a memória do paciente.

Com isso, o trabalho básico do jogador continua sendo explorar as memórias e assistir às cenas da vida do paciente, tentando entender sua vida e o que precisa ser mudado. Ou seja, são basicamente a mesma estrutura e proposta de To the moon. O que Finding Paradise vai mudar são alguns elementos da história e, principalmente, o tom. E essas duas coisas estão intrinsecamente ligadas, então eu vou ter que pular de uma para outra para conseguir explicar um pouco as peculiaridades do jogo.

Eu acredito que a melhor coisa em Finding Paradise é a premissa inicial dessa sequência. Em To the moon, o perfil do paciente era, provavelmente, aquilo que a maioria das pessoas esperaria considerando o tema da história: uma pessoa um tanto sozinha, com alguns arrependimentos e incompreensões marcantes em sua vida, e que, por um motivo ou outro, não conseguia fazer as pazes com o que viveu até aquele momento.

Finding Paradise coloca uma questão mais instigante e arriscada: o novo paciente, Colin Reeds, não é alguém com arrependimentos, solidão ou sofrimentos marcantes. Pelo contrário: ele é alguém cuja família está presente, ele parece feliz ao longo da sua história e, no geral, tem uma vida muito bem realizada. Entretanto, no fim da vida, ele resolve contratar os doutores porque, apesar de tudo, algo ainda parecia estar faltando, um algo que ele mesmo não entende.

A questão pega todos de surpresa, a ponto de a própria família ficar magoada e não entender o que pode motivar uma pessoa como Colin a desejar esse tipo de serviço. A premissa do jogo é, então, excelente, porque vai discutir uma coisa muito pouco tratada, que é a ideia de que algumas pessoas podem sentir inquietação e angústia mesmo quando tudo parece ótimo. Aliás, muitas pessoas deprimidas recebem aquele bom e velho discurso de que existe muita gente sofrendo no mundo, e que não é justo alguém que tem saúde, família e dinheiro se sentir mal consigo mesmo. É uma proposta que provavelmente só existe em jogos como Actual Sunlight, de que eu já falei aqui no canal, e que se dedicam a problemas muito modernos e que têm raízes psicológicas genuínas e importantes para o mundo de hoje.

Porém, apesar dessa premissa nova, Finding Paradise ainda prefere um caminho mais tradicional para resolver as angústias da vida de Colin, e as respostas às perguntas inquietantes do começo acabam sendo muito menos ambiciosas do que seria de se esperar. Em grande medida, eu acredito que isso tenha se dado porque uma angústia como a proposta no início não necessariamente seria causada por um ou outro evento na vida do personagem e por isso simplesmente não seria alterável, considerando justamente que as habilidades dos doutores é mudar eventos de vida. Por isso mesmo, a experiência de Finding Paradise acaba sendo um tanto decepcionante, mas só porque a promessa era muito grande.

Para falar a verdade, é difícil para mim apontar erros em Finding Paradise, especialmente no tocante à história, porque a capacidade do diretor e roteirista Kan Gao em criar histórias e diálogos sinceros é provavelmente uma das maiores da nossa indústria. Eu acredito que, quando se trata de criar narrativas dedicadas a falar da beleza dos pequenos momentos da vida e da importância do companheirismo e das relações humanas, provavelmente não há ninguém melhor trabalhando em jogos hoje.

E, por isso mesmo, Finding Paradise, como To the moon e A bird story, é repleto desses momentos belos e tristes, que funcionam como espelho um para o outro, e que fazem das coisas boas um alívio para o sofrimento, e do sofrimento um contraste para as alegrias. Isso faz com que a história de Colin ainda mantenha aquele tom melancólico e triste, mas sem nunca cair no melodrama, o que provavelmente é a maior e melhor marca dos jogos desse estúdio.

O tom e os temas que os jogos da Freebird escolhem tratar ressoam especialmente comigo, e é por isso que eu disse que é difícil apontar os problemas do jogo, mas, ao mesmo tempo, eu não consigo fingir que eles não estão lá. E, enquanto a questão do tratamento decepcionante da premissa pode ser vista como eu apenas esperando algo que o jogo nunca pretendeu fazer, há dois elementos que ainda prejudicam a execução de Finding Paradise, mesmo considerando apenas o que está presente na experiência.

O primeiro é que, em Finding Paradise, a delicadíssima harmonia de tons presente em To the moon é quebrada em favor do humor. Como eu falei na minha análise anterior, To the moon conseguia o incrível feito de balancear o tom melancólico das memórias dos pacientes com a interação divertida dos dois doutores. Era um risco enorme criar esse tom misturado, mas as brincadeiras eram usadas com moderação e sabiam o seu lugar, e o resultado acabou dando uma leveza muito especial ao jogo.

Finding Paradise apresenta muitos momentos divertidos durante a experiência, e muitas vezes a história do jogo acaba quase parando só para oferecer referências à cultura moderna e a outros jogos, ou então apenas para oferecer algum alívio cômico. Como eu disse, fazer isso em moderação foi muito saudável para To the moon, e certamente esse tipo de coisa acaba dependendo de cada um, mas eu acabei achando que houve um exagero no destaque dessas situações, a ponto de tirar o foco jogador da sinceridade dos momentos íntimos que Finding Paradise tenta apresentar.

Além disso, o jogo ainda apresenta um minigame toda vez que os doutores vão usar um objeto e passar para a próxima memória, que infelizmente distrai o jogador da tensão da história, tirando o foco do mundo e das situações que o jogo sabe criar tão bem. É algo que já estava existia em To the moon, mas que acabou ganhando ainda mais destaque, porque o novo minigame, que imita um jogo de match three a la Candy Crush, acaba oferecendo mecânicas novas e mais complexas ao longo da experiência, o que, se num jogo mais tradicional seria algo bem-vindo, num jogo tão focado na história acaba fora de lugar, e quase um empecilho.

Como eu disse no meu outro vídeo, o gameplay de exploração e investigação de To the moon já era mais do que suficiente para envolver o jogador e ser coerente com a proposta do jogo, e o mesmo vale para Finding Paradise.

Enfim, apesar disso tudo, o jogo continua sendo exemplar em criar situações emotivas que soam absolutamente sinceras e que conseguem comover o jogador. O script, de que um jogo desse tipo tanto depende, ainda mantém uma qualidade altíssima, especialmente quando estamos falando das memórias do Colin. A trilha sonora continua excepcional, o que é importante mencionar depois de A bird story não conseguir se destacar tanto quanto To the moon nessa área.

Por tudo isso, Finding Paradise certamente é um ótimo jogo. Há muito a apreciar nele, mas, ao mesmo tempo, eu sinto que a Freebird está abandonando alguns dos pequenos detalhes e acertos que ela conseguiu executar em To the moon, que continua sendo o melhor exemplo em contar uma história com simplicidade, mas com muita emoção e que ressoa profundamente com os jogadores. Entretanto, com indicações de que novos jogos naquele universo já estão a caminho, eu temo que as coisas continuem indo para longe da excelência inicial, em vez de o estúdio investir para aprimorar o modelo que eles mesmos criaram.

E era isso que eu queria dizer sobre Finding Paradise. Até a próxima análise!

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