segunda-feira, 16 de dezembro de 2019

Castlevania: Aria of Sorrow - Pensando sobre o jogo




Olá! Hoje vou falar de Castlevania: Aria of Sorrow, jogo desenvolvido pela Konami e lançado em 2003 para Gameboy Advance. Hoje, portanto, damos seguimento à série sobre a franquia Castlevania e encerramos o trio de jogos desenvolvidos para o Gameboy Advance.

Se eu tivesse que resumir a situação de Aria of Sorrow dentro da série Castlevania já para a gente começar a discutir, eu diria que o jogo marca o ponto em que a série se tornou tão consciente do seu legado que grande parte da sua estrutura acaba sendo concebida e entendida baseado na série de lugares-comuns já estabelecidos pelos jogos anteriores. Ou seja, pensar Aria of Sorrow significa, muitas vezes, enxergar um jogo que parece se forçar o tempo todo seja a inovar, seja a se manter tradicional.

Acho que o ponto mais óbvio para se enxergar isso é a história: Aria of Sorrow se passa no Japão em 2035, sendo, portanto, futurista e fora do eixo europeu que pautou a série até aquele momento. O protagonista é o jovem Soma Cruz, que provavelmente é europeu, mas que está visitando um templo no Japão durante um eclipse, quando é transportado para o castelo de Drácula. O clássico vilão da série, por sua vez, supostamente foi vencido em definitivo havia 36 anos e a existência do seu castelo é, por si só, um mistério.

Esse cenário parece completamente distinto dos clássicos da série, porém, quanto mais a gente explora o jogo, mas ele se revela semelhante: embora o Soma não seja um protagonista padrão num primeiro momento, logo é aludido que os poderes que ele ganha ao explorar ao castelo têm uma fonte sombria. Com isso, imediatamente o modelo de Symphony of the Night vêm à mente, com um herói que usa poderes das trevas para vencer o mal. E, conforme o jogo avança, a gente reencontra alguns sobrenomes muito conhecidos dentre os NPCs, como Belnaldes e Belmont.

Além disso, embora o cenário seja algo futurista, as armas e demais itens ainda têm suas origens em padrões medievais. O castelo em si também mantém a estética pela qual a série é conhecida, e o detalhismo gráfico continua nos passos de Harmony of Dissonance, desafiando os limites do Gameboy Advance. Se existe algo mais típico de Aria of Sorrow nesse quesito, seriam apenas as roupas dos personagens, que são modernizadas.

No tocante ao gameplay, a gente vê um movimento muito semelhante. Aria of Sorrow é o terceiro jogo da série a andar nos mesmos passos de Symphony of the Night e adotar um modelo metroidvania, em que você vai explorando o castelo de Drácula aos poucos, expandindo o número de áreas acessáveis conforme adquire novas habilidades, e aumentando seu poder conforme acumula experiência e coleta novos itens. O level design do jogo é certamente um avanço imenso em relação a Harmony of Dissonance, que era muito simplista, como eu falei no meu texto sobre o jogo.

Aria of Sorrow é cheio de elevadores e de uma verticalidade interessante, o que se soma ainda a algumas áreas em que é preciso pensar e testar estratégias diferentes para acessar. Há uma boa variedade de itens escondidos em salas secretas ou difíceis de acessar, o que torna a exploração em si muito interessante.

Se há um problema com o lado de exploração do jogo, é apenas uma certa falta de ambição com as habilidades disponíveis no jogo. Muitas delas são até irrisórias quando você fala em voz alta, como a habilidade de andar sobre a água ou mesmo embaixo dela. Certamente elas cumprem seu papel – a falta delas bloqueia áreas e a presença delas expande o mapa. Porém, eu sinto falta de habilidades que expandem a movimentação do personagem de forma mais expressiva, o que era especialidade de Circle of the Moon. A primeira habilidade que você ganhava naquele jogo era a de correr, algo que mudava muito a forma como você explorava o castelo já nos primeiros minutos.

Mesmo se a gente recuar até Symphony of the Night, as habilidades daquele jogo são tão memoráveis não só porque elas expandem as áreas exploráveis, mas porque elas transformam o jogo de diversas formas. Há até algumas habilidades mais interessantes em Aria of Sorrow, mas elas aparecem em pontos extremamente tardios do jogo, quando praticamente todo o castelo já está explorado e é mais prático apenas usar a rede de teletransportes do que explorar com suas novas habilidades.

O verdadeiro acerto puro de Aria of Sorrow está no sistema de captação de almas. Os poderes sombrios de Soma permitem que ele absorva as almas dos inimigos, o que, na prática, quer dizer que ele ganha habilidades específicas de cada inimigo. Elas podem ser projéteis diferentes para usar, habilidades passivas ou mesmo mecanismos de defesa. Cada tipo de inimigo cede uma habilidade única, porém nem todo inimigo derrotado cede uma alma – há apenas uma pequena chance de isso acontecer.

Na prática, isso é um mecanismo eficaz de manter o jogador engajado com o combate do jogo. É uma prática bem comum nas últimas partes dos metroidvanias da série o jogador simplesmente ignorar os inimigos, especialmente se ele já tiver habilidades que tornem isso mais fácil. A possibilidade de ganhar habilidades únicas mantém o jogador pronto a combater e fornece pequenas doses de recompensa em situações que, normalmente, seriam tediosas.

E vale dizer que essas habilidades são realmente úteis e muitas delas me salvaram em lutas mais ou menos complicadas. O fato é que esse sistema torna o combate algo mais interessante e permite uma customização imensa ao jogador, o que é um contrapeso na balança em relação à mediocridade das habilidades relacionadas a movimentação e acesso. Por um lado, Aria of Sorrow é muito aberto e ambicioso; por outro, parece que muitas vezes faltam ideias.

Em grande medida, isso é o peso de ser o quarto jogo a adotar um determinado modelo de jogabilidade, e isso num período de 6 anos apenas. Se a gente excluir Symphony of the Night, cabe considerar que, naquele momento, os jogos da série para Gameboy Advance eram anuais e não só isso: Harmony of Dissonance tinha sido lançado menos de um ano antes, com ambos tendo sido desenvolvidos ao mesmo tempo por subtimes dentro do mesmo estúdio da Konami.

Se a gente voltar ao que eu disse sobre Harmony of Dissonance ser um dos primeiros jogos a mostrar uma certa falta de ambição na série, com quase cada título até então tendo sido marcado por coisas absolutamente memoráveis, é difícil não notar um pouco dessa questão também em Aria of Sorrow. O jogo mantém limitações evidentes na área de movimentação, enquanto procura inovar com o sistema de habilidades de almas. Vale dizer, ainda, que há sinais de que havia um esforço para também absorver as críticas ao jogo anterior, com melhorias no som e, eu acredito, no level design.

Entrando ainda mais na especulação, se os dados da Wikipedia e suas fontes forem de confiança, a série vivia um certo declínio de vendas na linha do Gameboy Advance. Enquanto Circle of the Moon foi extremamente bem-sucedido, os demais nunca alcançaram seu sucesso. É de se pensar o quanto isso era responsável por mudanças ou limitações no jogo.

Do mesmo jeito que a recepção negativa do som de Harmony of Dissonance motivou o time a reelaborar a estrutura do som em Aria of Sorrow, mesmo sabendo que o jogo teria que ser lançado em 2003, quantas outras decisões poderiam afetar o ciclo de desenvolvimento e criar limitações que acabam deixando o jogo um pouco à sombra de seus pares?

O par Harmony of Dissonance e Aria of Sorrow me faz pensar muito nesses percalços do desenvolvimento de jogos: dois jogos desenvolvidos quase simultaneamente, dentro de um mesmo estúdio, lutando para avançar um formato e inovar, ao mesmo tempo em que um tanto presos ao compromisso de honrar as vendas surpreendentes de Circle of the Moon. Há um ponto em que o orçamento do jogo e a data para finalizar acabam falando alto demais e escolhas precisam ser feitas.

E é preciso dizer que eu acho que Aria of Sorrow, no geral, desempenhou um bom papel com esses desafios: propôs uma mecânica completamente nova com o sistema de captação de almas, criou um level design interessante, aumentou a qualidade do som e propôs alguns novos elementos à história. É claro que o jogo possui as limitações que eu já mencionei, mas certamente está diversos passos à frente de Harmony of Dissonance. O único negativo importante que chama minha atenção são os sinais de o ciclo de desenvolvimento do jogo parecer cada vez mais tortuoso e os desafios, maiores.

E era isso que eu queria dizer sobre Castlevania: Aria of Sorrow. Até a próxima análise!

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