segunda-feira, 2 de dezembro de 2019

Altered Beast - Pensando sobre o jogo




Olá! Hoje vou falar do clássico Altered Beast, lançado em 1988 para arcade e Mega Drive, e depois relançado inúmeras vezes até os dias de hoje.

A partir de todos os ângulos por que a gente decida olhar para Altered Beast, nós veremos um jogo muito simples. Trata-se de um beat’em up clássico, em 2D, não isométrico como a maioria dos seus pares, em que você controla um guerreiro ressuscitado por Zeus e incumbido de resgatar a deusa Atena do vilão Neff. Para isso, você obtém o poder de se transformar em feras com poderes variados.

A quantidade de ataques possíveis de realizar no jogo é bem limitada. Basicamente você tem um soco baixo e alto, um chute para cima, e você pode chutar e socar enquanto pula. É isso. Os inimigos também não demoram muito para morrer; geralmente um ou dois ataques serão suficientes. As cinco fases do jogo apresentam uma variedade interessante de inimigos, com poucos se repetindo entre fases, mas, no geral, é bem simples perceber a estratégia para vencer quase todos. Apenas os inimigos da última fase ainda me pegam desprevenido.

Porém, eu diria que é essa simplicidade de Altered Beast que faz com que ele funcione corretamente e que faz dele um jogo de um gênero muito curioso na nossa indústria. No fundo, Altered Beast é um daqueles jogos antigos que giram em torno da ideia de te vencer pelo cansaço, ou seja, é um tipo de jogo em que uma partida de alguém que sabe o que está fazendo não dura muito tempo, enquanto a partida de um principiante pode se alongar loucamente.

Isso acontece porque existe um gatilho para que as fases acabem em Altered Beast: é preciso chegar ao chefe transformado numa fera e, para isso, é preciso coletar três orbes depois de matar três lobos. Cada um desses orbes te dá diferentes bônus em termos de força e alcance, com o terceiro te transformando numa fera, que tem ataques extremamente úteis e poderosos.

O grande problema é que os lobos não ficam na tela por muito tempo, sendo essencial que você os ataque na hora certa. Conforme as fases vão se seguindo, isso vai se tornando uma mistura de posicionamento correto, timing e capacidade de lidar com outros inimigos que aparecem apenas para te distrair dos lobos. Se você tiver êxito e matar os lobos o mais rápido possível, você chegará ao chefe, ele se transformará num monstro também e você terá uma luta que permitirá passar para a próxima fase.

Caso você não tenha conseguido os três orbes, o chefe vai sumir e você vai ter que passar por uma nova sequência naquela fase, com os lobos aparecendo de novo. Porém, como você fica mais tempo exposto aos inimigos, a possibilidade de tomar dano é maior e aumenta, assim, a chance de chegar ao chefe e às próximas fases em piores condições do que o ideal.

Assim, o grande apelo de Altered Beast é o trabalho de aprender onde cada inimigo e, especialmente, onde cada lobo aparecerá, planejando os ataques corretos para chegar ao chefe logo, vencê-lo e passar à próxima fase. Com a execução correta, uma partida de início ao fim do jogo vai durar apenas uns 10 minutos. Porém, essa execução correta não é fácil, e não demanda muito de você ou dos controles, e sim da sua capacidade de agir corretamente, já com o conhecimento do que virá em seguida.

Nesse sentido, a curtíssima duração de Altered Beast é algo extremamente positivo, porque permite ao jogador ter um roteiro exato na sua cabeça, de forma que uma partida de alguém experiente pareça algo como uma dança, em que o personagem se move e age já ciente do que vem por aí, e em perfeita harmonia com o que o jogo demanda dele.

Curiosamente, embora tenha sido voga por um tempo considerável, esse tipo de jogo tem estado sob ataque por parte dos jogadores, e a sua queda veio com a ascensão dos jogos roguelikes, em que os cenários e inimigos são randomizados. Embora roguelikes certamente sejam um estilo interessante e certamente muito mais desafiador do que jogos como Altered Beast, já que a improvisação e a tensão são uma parte essencial deles, eu ainda não consigo negar o poder que a experiência de Altered Beast proporciona.

Ele é um jogo que o jogador pode entender e dominar rapidamente, e a execução necessária acaba demandando um treino que se torna quase ritualístico. E o ritual é algo essencial na experiência humana. É algo que nos dá conforto, nos permite um sentimento de segurança e controle que, em última instância, é importante para nossa estabilidade. Adotar hábitos é algo que advém não apenas da praticidade de poder deixar de pensar em certos assuntos, para que eles sejam executados quase que automaticamente por nós, mas também da necessidade que temos de ver um mundo organizado e que faz sentido aos nossos olhos.

Retomando a comparação que eu fiz há pouco, uma partida de Altered Beast é como uma dança, em que, no começo, você tropeça, pisa no pé da pessoa e erra o ritmo. Porém, com a prática, você consegue executar 100% do que planejou e isso acaba sendo uma experiência que dá uma satisfação que parece até estranha numa época em que a gente é incentivado tanto a tentar coisas novas, mas que serve para nos relembrar daquele tipo de jogo que nós tanto jogamos na infância, e que era o nosso jogo, aquele que a gente conhecia de cabo a rabo; ou então daquele episódio de Chaves ou outro programa que, apesar de a gente já ter visto tantas vezes, a ponto de decorar as falas, ainda nos faz rir com a mesma piada velha.

É claro que é difícil falar de uma obra assim em termos de grandes contribuições a um gênero ou como uma experiência fundamental; porém, a repetição, a memorização e a ritualização que o jogo incentiva são certamente típicas de vivências rituais que nós abraçamos e que servem para a gente criar nossa própria realidade, chamar o mundo de nosso.

E era isso que eu queria dizer sobre Altered Beast. É um jogo simples, que pode parecer até bem datado, mas que oferece uma experiência confortável, com o mesmo combate correto, as mesmas boas músicas e o mesmo ritual satisfatório que fazem com que ele entre em nossa mente e não saia tão cedo. Até a próxima análise!

Nenhum comentário:

Postar um comentário