Olá!
Bem-vindo ao canal TheAsaGames! Eu sou o Asa e hoje vou falar de Bastion, jogo da Supergiant Games,
lançado em 2011 para Xbox 360 e PC, em 2012 para iOS, e em 2015 para PS4. Ele é
um jogo muito interessante, e que oferece uma forma bem inovadora de lidar com
a história, e isso em vários sentidos.
Bastion conta a história de um garoto
sem nome que vivia na cidade de Caelondia. Num certo dia, ele acorda e percebe
que tudo ao seu redor está desmoronando, e que o que resta da cidade está
flutuando no meio do ar. Ele, então, se dirige ao Bastion, que era o ponto de
encontro dos cidadãos em caso de emergência.
Lá ele encontra apenas
um velho chamado Rucks, que conta que, para conseguir vencer a Calamidade, que
está destruindo o mundo, o garoto precisa se aventurar pelas ruínas de
Caelondia para juntar cristais que dão energia ao Bastion. Para obter esses
cristais, entretanto, ele precisa enfrentar várias criaturas hostis que habitam
esses locais. E, enquanto ele se aventura, ele pode encontrar outros
sobreviventes.
Na prática, Bastion é um jogo de aventura com ponto
de vista isométrico, em que se controla o garoto durante suas expedições. Em
termos de jogabilidade, o grande apelo do game
é a multiplicidade de armas: em quase todas as missões principais, o garoto
encontra novas armas, que funcionam de formas bem distintas e demandam
estratégias únicas para dominar.
Basicamente, essas
armas se dividem entre armas de curta e de longa distância. Dentro desses dois
grupos, as coisas ainda se dividem de forma bem clara: armas de curta distância
podem focar em velocidade, ou em dano imediato, ou até em dano ao longo do
tempo; já armas de longa distância podem priorizar velocidade, dano a um
inimigo específico ou dano a uma área inteira. E, claro, todas elas são
balanceadas de forma a terem suas fraquezas e forças, o que, como eu disse,
oferece estratégias bem interessantes.
Dominar tantas armas
não é exatamente um processo fácil, e provavelmente o jogador vai ter sua
estratégia preferida. Eu, por exemplo, tive um apego bem maior a algumas das
armas iniciais, que eu acho que ofereciam um estilo mais próximo do meu gosto
do que as armas disponíveis no fim do jogo. De qualquer forma, o jogo oferece
campos de treinamento para que o jogador possa aprender as dinâmicas de cada
uma, e jogar bem com elas oferece diversas recompensas.
E essas recompensas são
uma forma inteligente de Bastion
lidar com a sua multiplicidade de armas: em cada campo de treinamento, há três
recompensas, que são oferecidas dependendo do desempenho do jogador. A primeira
recompensa é sempre um material para upgrade
da arma com que se está treinando. Mas, o interessante é que a segunda
recompensa é um material para upgrade
de outra arma.
Ou seja, talvez você
não esteja tão interessado na arma com que está treinando, mas se interessa por
alguma cujo material está sendo oferecido naquele treinamento. Isso motiva o
jogador a tentar os desafios de várias armas, o que pode acabar despertando o
interesse dele pelas mecânicas específicas dessas armas, mesmo que ele já
esteja acostumado com outras.
Essa questão de upgrades que eu mencionei há pouco
também oferece algo muito interessante, que é a possibilidade de escolher que
tipo de upgrade fazer. Quando se tem
um material, o jogador pode fazer um upgrade
e escolher o que acha melhor para sua estratégia. Digamos, por exemplo, que o
jogador use uma arma de longa distância que tem um pente de munição limitado:
ao fazer upgrade ele pode escolher se
quer que cada projétil dessa arma tenha um dano maior, ou se prefere que o
processo de recarregar o pente seja mais rápido.
Com isso, todas as
armas de Bastion se revelam muito
versáteis, e o jogador acaba fazendo com elas mais ou menos o que quiser, e
isso favorece muito a criação de diversas estratégias que, em última instância,
tornam o gameplay muito maleável e
capaz de se adequar à forma como o jogador prefere jogar.
Isso se reflete
igualmente nos upgrades do
protagonista e na nivelação de dificuldade do jogo: conforme o jogador mata
inimigos, ele ganha experiência e ganha a possibilidade de usar um tônico
diferente que dá bônus específicos, como ter mais HP, poder carregar mais itens,
poder reviver se levar um golpe mortal, etc. Mas, é claro, cada nível habilita
apenas um espaço para esses tônicos, então o jogador deve escolher quais são
suas prioridades.
Já a dificuldade do
jogo funciona de forma a permitir que o jogador tenha o desafio que preferir.
Existe a versão básica do jogo, que terá momentos de dificuldade, com inimigos
bem variados e com algum desafio, mas que é relativamente tranquila, já que a
curva de aprendizado é bem generosa. Entretanto, existe um altar no Bastion que
permite que o jogador adicione desafios em troca de bônus de dinheiro e de
experiência.
Esses desafios são bem
variados, como fazer os inimigos serem mais agressivos, fazer com que eles
tenham mais HP, fazer com que eles soltem uma bomba antes de morrerem, deixar o
protagonista mais lento caso ele receba um golpe, etc. Um ou outro desafio
desses não é exatamente um problema, mas reunir mais de 5 desafios é complicado
até para os jogadores experientes.
Por conta dessas
coisas, em termos de mecânicas, Bastion
é um jogo excelentemente executado, que investe todas as suas fichas numa
experiência altamente customizável, permitindo que o combate seja o mais
agradável possível para o jogador, e que faz com que ele se sinta bem relaxado
ou extremamente tenso conforme quiser.
Mas, embora isso seja
algo a se elogiar bastante, isso não é o brilho maior de Bastion. Esse brilho está na história e nas diversas formas
criativas que o jogo escolhe para criar sua narrativa. O primeiro elemento
criativo na narrativa de Bastion é
aquele que perpassa toda a experiência, que é o narrador do jogo. Desde o
primeiro minuto da experiência, o jogador vai ouvir uma voz que acompanha a
história do garoto, e se trata do velho Rucks, que habita o Bastion.
Esse narrador atende
aos requisitos mais básicos dessa função, ou seja, é capaz de sumarizar bem os
acontecimentos que estão sendo mostrados, e também tem uma voz realmente
agradável e grave, que se encaixa bastante com a função de alguém que
supostamente sabe tudo o que está ocorrendo.
Mas, o que diferencia o
narrador de Bastion dos outros é a
sua flexibilidade para se adaptar aos movimentos do jogador. É incrível como
ele parece ter sempre algo para dizer, até quando você faz o que não deveria.
Ele comenta se você progride, se você fica num lugar mais do que o esperado, se
você cai, se você vence um inimigo, se você perde, se você faz um upgrade, se você escolhe uma nova combinação
de armas, etc.
E, graças a isso,
parece que esse narrador está realmente acompanhando a história, e que o
jogador realmente está escrevendo essa história. Eu já comentei um pouco sobre
uma dinâmica semelhante a essa no meu vídeo sobre The Stanley Parable, mas o que diferencia Bastion é o fato dessa flexibilidade do narrador se dar nos mais
diversos e minúsculos acontecimentos da experiência, e não só nos momentos
fundamentais em que a narrativa poderia se dividir, como é em The Stanley Parable.
Isso dá à trama de Bastion um nível de interatividade que é
difícil encontrar em qualquer outro jogo. Hoje nós estamos bem acostumados com
a ideia de que um jogo conta com decisões e que elas vão impactar no
desenvolvimento da experiência. Mas, nós estamos também acostumados a ver esses
momentos de escolha de forma bem destacada nos jogos, como se os
desenvolvedores deixassem o jogador escolher ponderadamente o que quer fazer.
Em Bastion, esse tipo de escolha destacada só acontece nos últimos
segmentos do jogo, e isso seria um dos momentos mais conservadores dessa
liberdade que Bastion permite. A
liberdade maior do jogador, em Bastion,
é poder fazer algo inesperado e ver que o narrador percebeu e reagiu a isso. É
como se a própria narrativa se abrisse ao jogador e o aceitasse, não importa
como ele queira jogar – exatamente como as armas e os upgrades permitem em termos de mecânicas.
Descrevendo neste vídeo
talvez pareça só um detalhe, mas é uma sensação diferente ver que o jogo dá uma
resposta quase imediata às ações do jogador. O padrão dos jogos é sempre ver a
história prosseguir quando se alcança determinados pontos, e a presença do
narrador de Bastion dá a sensação de
que a narrativa do jogo não está só em pontos específicos, mas também a todo
minuto, sempre aguardando o próximo movimento do jogador, não importa qual
seja. É algo totalmente único.
E, além desse narrador
fantástico, Bastion também faz algo
impressionante na caracterização de personagens ou, melhor dizendo, de uma
personagem específica. Um dos pontos fracos desse narrador tão forte de Bastion é o fato de que absolutamente
tudo tem que passar por ele: mesmo quando o garoto está conversando com outros
personagens, o jogador ouve apenas a versão resumida da conversa pelo Rucks.
Além disso, o jogo tem
pequenos momentos, que o jogo chama de reflexões, em que o jogador pode ouvir
um breve resumo da história de cada personagem importante, mas aí também é tudo
resumido pelo narrador. Esse centralismo forte do narrador poderia diminuir
muito a figura dos personagens, já que eles nunca ganham voz; nós os conhecemos
sempre indiretamente.
Para conciliar esse design do narrador com uma criação de
personagens realmente interessante, Bastion
fez uma experimentação muito interessante com a personagem Zia. Zia é uma Ura,
um povo que esteve em guerra com os moradores de Caelondia, mas a Zia nasceu em
Caelondia. Ela tem uma história de antes da Calamidade que poderia ajudar o
jogador a criar um vínculo com ela, mas, como eu disse, o fato de tudo ser
filtrado pelo narrador não permite ligações tão fortes.
Entretanto, todo o
vínculo de que o jogador realmente precisa já é criado na fase em que o garoto
encontra a Zia pela primeira vez. No momento em que ele entra na região em que
ela está, ele começa a ouvir uma música lindíssima, e que faz de todo o tempo
naquela fase uma experiência mais bonita e agradável. Ao final, o garoto
descobre que a música estava sendo cantada pela Zia.
Esse momento de criação
do personagem tem um efeito tão grande no sentido de a Zia ser vista como
alguém realmente agradável, que toda a dificuldade que a narração cria acaba
sendo superável. E é incrível como é raro esse fenômeno de usar a música para
estreitar a relação do jogador com certos personagens. Além desse incrível
momento em Bastion, eu consigo
lembrar apenas de uma cena em Bioshock
Infinite, em que a Elizabeth canta. Se alguém lembrar de mais algum
momento, por favor, deixe nos comentários.
É muito comum a gente
ver jogos que se esforçam ao máximo para criar personagens que possam ser
cativantes de fato, mas sempre focando no roteiro e, principalmente, no visual.
São inúmeros os jogos que deixam muito claro que os personagens foram
concebidos visualmente de certo jeito para que o jogador sentisse admiração por
eles, ou então que sentisse atração por eles.
É muito raro ver
personagens que são construídos graças à sua voz, ou à trilha sonora que os
acompanha. E isso é até algo bem estranho, já que é bem sabido que o poder da
música sobre a mente humana é incrível e que ela pode influenciar, de diversas
formas, os nossos sentimentos.
Felizmente, a equipe
responsável por Bastion sabia disso e
criou um personagem extremamente memorável e com quem o jogador realmente se
importa, e tudo isso graças a uma música. Eu acabei me importando tanto, que
posso dizer que foi ela quem me influenciou na hora de escolher o final do
jogo.
E, falando em final, é
preciso dizer que a história do jogo, em termos gerais, é bem interessante, e
que faz uma rica discussão sobre a relação do indivíduo com o resto do mundo
quando não se está exatamente feliz com a realidade. Os personagens de Bastion experimentaram mudanças muito
grandes em suas vidas após a Calamidade – algumas para melhor, outras, para
pior.
Em grande medida, o
final do jogo permite que o jogador escolha o que fazer com um mundo que trata
as pessoas de forma hostil – será que é melhor tentar apagar os erros do
passado ou simplesmente tentar viver para além deles? É uma pergunta muito
interessante e que o jogo reflete bem nos próprios personagens e na sua relação
com o mundo.
E o jogo permite que o
jogador escolha uma última vez – como ele foi capaz de determinar muito do seu
progresso durante o jogo. É o capítulo final no respeito do jogo às decisões do
jogador, que começa com a customização e passa pelo narrador. No final, o jogo
pede que o jogador dê um sentido à jornada que viveu.
E era isso que eu
queria dizer sobre Bastion. Ele é um
jogo que dá muito poder de escolha ao jogador, e faz com que ele se sinta
realmente parte da história até nos mais mínimos detalhes, o que é algo
incrível de sentir a cada minuto da experiência. Além disso, é um jogo que
busca caracterizar os personagens de forma não convencional, o que é uma
importante lição para a nossa indústria, tão apegada a modelos.
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