Olá!
Bem-vindo ao canal TheAsaGames! Eu sou o Asa e hoje vou falar de Uncharted: Drake’s Fortune, jogo da
Naughty Dog lançado para PS3 em 2007. Ele não é um jogo extremamente bem
realizado, mas tem seu valor e mostra algumas tendências importantes que a
gente pode encontrar na indústria.
Uncharted conta a história da relação de
três personagens: Nathan Drake, Victor Sullivan e Elena Fisher, que estão
determinados a encontrar o tesouro perdido de El Dorado investigando pistas
deixadas por Sir Francis Drake, um explorador inglês real, que viveu no século
XVI. Entretanto, enquanto exploram, os três precisam tomar cuidado com bandidos
que estão atrás do mesmo tesouro.
Dentro
dessa proposta bastante simples, Uncharted
brilha na forma como dinamiza a relação dos seus personagens. Muita gente fala
que esses personagens são a melhor coisa do jogo, e que eles são bem
construídos, mas faz tempo que eu penso exatamente o que faz desses personagens
algo tão bom, e isso eu acho que ainda falta ser dito.
O
que faz de Drake, Elena e Sully personagens realmente interessantes é o fato de
que a independência deles está sempre em questão no jogo; eles nunca parecem
totalmente alinhados com ninguém. Por isso, existe sempre uma certa tensão em
cada diálogo, mas é uma tensão que não implica violência, mas sim humor.
Isso
se manifesta de diversas formas. Durante o jogo, há uma série de conversas em
tom sarcástico entre os personagens e, especialmente, entre os protagonistas e
os vilões. Tudo parece ser uma disputa um tanto esportiva, mesmo quando há
vidas em jogo. Situações de vida e morte acabam sendo tratadas como meras
batalhas a disputar num meio de uma guerra muito maior. E isso é bastante
adequado ao enredo do jogo, que é povoado por conflitos armados que, na maioria
das vezes, não resolvem nada, e só levam a mais uma parte de exploração, mas eu
volto a isso mais tarde.
O
que mais me chama a atenção nos personagens do primeiro Uncharted é como o jogador nunca consegue ter certeza do que eles
estão pensando ou de que eles estão do lado um do outro: haverá momentos em que
o jogador se questionará sobre a lealdade do Sullivan; haverá outros em que o
Drake parecerá mais um aproveitador do que um herói; e haverá pontos em que a
Elena parece mais uma viciada em adrenalina do que uma repórter.
Tudo
isso cria uma série de desconfianças que deixa sempre um suspense na cabeça do
jogador em relação a quem são esses personagens. Isso porque, quando não estão
perto do Drake, o comportamento deles é imprevisível e isso, aliado a esse
humor e coragem com que eles encaram todas as situações de perigo, faz deles
sempre personagens algo charmosos, no sentido de que eles parecem apenas
mostrar uma pequena parte sua para o jogador e sempre parece haver algo mais a
descobrir sobre eles; eles parecem mais humanos dessa forma.
Esse
comportamento mais humano desses personagens acaba aproximando Uncharted definitivamente das obras que
são obviamente a sua inspiração, que são os filmes da série Indiana Jones. Para quem está bem
familiarizado com os filmes e com o jogo, fica bastante clara a semelhante
absurda de Uncharted com Caçadores da Arca Perdida, que é o
primeiro filme do Indiana Jones.
Isso
não é um demérito do jogo; na verdade, é um sucesso, na medida em que recriar
personagens como aqueles não é exatamente um trabalho muito fácil. De qualquer
forma, tanto o Drake quanto o Jones têm um bom coração, mas também um lado um
tanto canastrão e que não se importa tanto com o sofrimento dos inimigos.
Já
a Elena e a Marion têm em comum o jeito muito aventureiro, apesar do seu
aparente despreparo. Em muitos casos, elas parecem mais corajosas do que os
protagonistas. Olhando as duplas de personagens agindo juntos, é bem clara a
semelhança do humor ácido com que eles se tratam.
Numa
medida de bom gosto, a Naughty Dog eliminou a presença de nazistas de Indiano Jones, já que Uncharted se passa num tempo muito mais
próximo ao nosso, e tenta demonstrar o que seriam verdadeiros bandidos hoje em
dia. Contudo, mesmo com a mudança, ainda é possível criar vilões que parecem
realmente uma encarnação do mal, mas ainda bem humorada e que se diverte em ver
as dificuldades dos protagonistas. E, para quem gostar de nazistas, o jogo
ainda dá um jeitinho de mencioná-los.
Por
conta dessas semelhanças, Uncharted
é, provavelmente, uma das mais bem executadas tentativas de adaptar um cenário
de filme para um jogo. O enredo, que é um lado geralmente muito criticado
quando filmes e jogos são comparados, acaba sendo muito bem feito e rivaliza
com Indiana Jones.
É claro que uma
discussão sempre pode surgir sobre que real valor existe em transpor, mesmo que
bem, uma trama de mais de 25 anos. Para mim, esse primeiro Uncharted é como um exercício da Naughty Dog, como um esforço de
criação de personagens realmente interessantes, e que possam se articular num
formato de video game de forma
natural. Isso provavelmente ajudou na elaboração dos outros personagens e
tramas que viriam daqui para frente no portfólio da empresa.
Mas, esse exercício de
articulação ainda tem alguns problemas, que me fazem pensar que, às vezes, Uncharted se comporta um pouco demais
como um filme. Em termos de jogabilidade, Uncharted
é um jogo de tiro e aventura em terceira pessoa, em que geralmente se alternam
três tipos de segmentos: combate, escalada e puzzle.
Em termos de gameplay, o único momento em que me
parece haver um maior número de acertos do que erros é no combate. Nesses
momentos, a ideia é que o jogador faça com que o Drake use a cobertura para se
esconder e atirar no inimigos, e isso funciona com uma certa competência,
exceto quando você manda o Drake rolar e ele acaba aderindo a alguma cobertura
sem querer.
De qualquer forma, o
que chama a atenção é inteligência artificial dos inimigos: eles sabem
flanquear muito bem, e é muito interessante como alguns deles fazem pequenos
movimentos que realmente podem livrá-los da morte. Por exemplo: no geral, as pistolas
do jogo matam um inimigo com três tiros. Mas, se o jogador atirar os três tiros
direto, pode ser que o inimigo abaixe a cabeça, ou então se mova rapidamente. É
algo bem impressionante de ver.
Mas, nem tudo são
flores com essa inteligência artificial, porque nem sempre ela esconde que sabe
o que você está fazendo. Além de ser um fato um tanto recorrente alguns
inimigos desviarem de balas de costas, o que chama mais a minha atenção é um
movimento que eles às vezes fazem. Digamos que um inimigo esteja escondido
atrás de um pilar.
O jogador, controlando
o Drake, opta por esperá-lo se expor de novo, e provavelmente vai escolher um
lado para mirar. O inimigo sempre vai sair pelo outro lado, não importa se ele
tinha como ver ou não onde o Drake estava mirando. É um efeito muito
artificial, mas, ao mesmo tempo, me faz pensar se os desenvolvedores não tinham
em mente colocar à disposição dos inimigos o mesmo tipo de câmera que o jogador
usa. Afinal, mesmo quando está na cobertura, o jogador pode ver além do ângulo
de visão do Drake.
Outra coisa dos
combates que me cansa um pouco é a quantidade meio grande de rodadas de
inimigos. Em certas partes do jogo, você precisa esperar até três ondas de
inimigos, e essas batalhas muitas vezes funcionam quase como filler para a história, não significam
muita coisa para o que está acontecendo, e nem servem para exibir melhor o
comportamento dos personagens.
Já os segmentos de
escalada funcionam de uma forma extremamente scriptada, de modo que retira toda a naturalidade da situação e, em
grande medida, fere as próprias regras que o jogo ensina a obedecer. Isso fica
claro na diferença das animações e dos resultados quando o Drake pula no lugar
correto para prosseguir com a escalada e quando ele pula no lugar errado.
Se o Drake pula no
lugar errado, ele dificilmente vai atravessar uns 2 metros de distância; agora,
se ele pular no lugar certo, ele pode tranquilamente passar o dobro dessa
distância. Isso cria um certo sentimento de confusão no jogador, porque
distâncias facilmente atravessáveis em certos momentos ficam impossíveis caso
não seja isso que o jogo quer que seja feito.
É claro que todo jogo
tem regras e é linear em certa medida, mas uma grande parte da técnica de fazer
um jogo realmente recompensador é fazer com que o jogador não sinta o peso
dessas limitações e muito menos com que ele sinta que as regras estabelecidas
mudam conforme o interesse da história ou do level design. É um erro cabal de um jogo como Beyond: Two Souls, e que já estava presente em Uncharted.
Por fim, os segmentos
de puzzle são muito curtos e
espaçados durante a experiência toda e, quando aparecem, são muito fáceis; é
quase como se fosse um embrião de puzzle,
como se estivessem faltando umas duas ou três etapas para finalizá-lo. E, com
isso, essas partes ficam no meio do caminho entre um filler e uma mera variedade de gameplay
sem muitas consequências. Numa história de explorar tesouros escondidos, sempre
é legal ter mais puzzles.
Com isso, Uncharted acaba se configurando, para
mim, como um experimento da Naughty Dog, em que eles tentaram criar um tipo de
jogo mais linear e cinematográfico. Eles, com certeza, conseguiram sucesso na
criação dos personagens, mas a jogabilidade luta bastante para chegar no ponto
correto, e ela flutua entre a boa execução, o filler e a linearidade excessivamente restritiva.
Essa flutuação é um
problema muito sério de jogos que buscam uma experiência mais cinematográfica e
scriptada. Ter um script bem claro não é um problema, mas,
se ele é tão importante, é preciso que a jogabilidade seja pensada a partir
dele, e buscando torná-lo mais interessante e renovado a cada momento. Um
grande script trabalha com cada cena
contando algo importante e com cada desenvolvimento parecendo algo natural.
E era isso que eu
queria dizer sobre Uncharted: Drake’s
Fortune. Ele é um jogo com vários pontos bem realizados em termos de
enredo, e com uma estética muito bonita, que prioriza cenários bem coloridos,
numa época em que predomina o cinza nos jogos. Mas, era preciso elaborar melhor
a jogabilidade para que esse enredo tivesse a chance de brilhar mais.
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