sábado, 23 de janeiro de 2016

Puppeteer - Pensando sobre o jogo



Olá! Bem-vindo ao canal TheAsaGames! Eu sou o Asa e hoje vou falar de Puppeteer, jogo do Studio Japan da Sony e lançado em 2013 para PS3. Ele é um jogo muito bem feito e com um imenso carisma, e que eu acho que representa bem um tipo de jogo bem direcionado para crianças ou para adultos, além de ser um exemplar bastante sólido de jogo que sabe usar o humor para criar uma bela experiência.

Puppeteer conta a história de Kutaro, um jovem garoto que vai dormir e acorda preso no corpo de um boneco, por obra do rei Urso da Lua. O rei aprisiona Kutaro no boneco e arranca a cabeça dele, pois é sequestrando crianças que o urso consegue seus servos e seu poder.

Na verdade, o urso era um tirano que roubou o trono da Deusa da Lua e de lá faz todo tipo de maldades. Para conseguir escapar do corpo de boneco e da Lua, Kutaro precisa restaurar os cristais que fornecem o poder da Deusa. Para conseguir isso, ele conta com a ajuda de alguns amigos, com a tesoura mágica Calibrus (uma referência à espada Excalibur) e com um conjunto de cabeças que estão escondidas no jogo todo.

Na prática, Puppeteer é um jogo 2D de plataforma e aventura em que se controla o boneco Kutaro em uma série de situações, enfrentando inimigos, alcançando localidades mais altas, derrotando chefes, etc. Há duas características que são fundamentais para a jogabilidade de game: a mecânica de cortar e a gestão de cabeças.

Esses dois elementos demonstram um dos princípios de composição mais importantes de Puppeteer, que é a polivalência das mecânicas, ou seja, tudo ali serve mais de um propósito. No caso da mecânica de cortar, isso se manifesta no fato de que o Kutaro pode usar a tesoura para cortar inimigos, mas também para alcançar locais de difícil acesso, já que cada corte bem-sucedido permite que ele permaneça no ar por um certo tempo, e enquanto ele estiver cortando algo, ele sempre pode avançar.

Por exemplo, ele pode cortar folhas que estão no ar para poder ir subindo até uma plataforma mais alta, ou mesmo desviar de armadilhas cortando em volta delas. Ao mesmo tempo, inimigos podem aparecer e são vencidos com o corte também. E esse mesmo princípio vale para todos os upgrades de mobilidade do Kutaro: eles servem como ferramentas para progredir nas partes de plataforma, e também como armas.

Já a gestão de cabeças une as habilidades especiais do jogo e a resistência do personagem. Ao longo do jogo, o Kutaro vai poder encontrar cabeças para usar, já que ele não tem a sua. Na prática, ele pode levar 3 cabeças simultaneamente, enquanto usa apenas uma. Ao levar um golpe, ele perde a cabeça, que começa a rolar pelo cenário, e o jogador tem alguns segundos para pegá-la antes que ela desapareça. O jogo só vai reiniciar de um checkpoint anterior se o Kutaro perder as três cabeças.

Ou seja, na prática, a gestão de cabeças equivale à gestão de saúde, mas feita, claro, de um jeito bem mais carismático, já que cada um desses elementos da vida do Kutaro tem uma peculiaridade e, para além de qualquer fator de jogabilidade, é bem comum lutar para não perder uma certa cabeça apenas porque você acha que ela é legal.

Outra coisa importante para se dizer sobre essa mecânica é que ela permite que o jogo se torne muito menos difícil, já que, embora três unidades de vida não seja algo exorbitante, o fato de você poder recuperar a vida perdida em poucos segundos é algo que garante uma certa segurança e previne que pequenos erros sejam punidos de forma irreversível. Por causa dessa mecânica, Puppeteer se torna um jogo muito convidativo para jogadores mais casuais e jovens, o que, como eu vou falar depois, se encaixa perfeitamente com a sua história.

Mas, como eu disse, essa não é a única característica do sistema de cabeças. Em Puppeteer, cada fase pode variar radicalmente de andamento dependendo da cabeça que o Kutaro tiver em seu poder. Cada fase do jogo é cheia de pequenos segredos que só podem ser revelados com determinada cabeça e elas, por sua vez, costumam ficar bem escondidas.

Por conta disso, a busca por todas as cabeças e seus segredos se torna algo realmente difícil de realizar em Puppeteer, adicionando um novo nível de dificuldade, que é bastante recompensador. É muito legal lutar contra um chefe pela primeira vez sem nenhuma ajuda, e depois simplesmente pular quase uma fase inteira da luta graças a uma cabeça específica, ou então encontrar uma fase bônus que só pode ser desbloqueada com certa cabeça. Vale dizer, também, que o segredo de uma cabeça pode estar até duas fases depois de onde a cabeça é encontrada, então é preciso ser habilidoso para não perdê-la no caminho.

Tudo isso cria uma certa dualidade nas mecânicas, que permitem complexidade e simplicidade, a depender do nível de desafio que o jogador pode e quer enfrentar. Isso permite que Puppeteer seja aproveitado por um público muito maior, especialmente por crianças e por um público mais maduro, oferecendo complexidade e diversão rápida em igual medida.

Por isso, eu passei muito do meu tempo com Puppeteer pensando em Child of Light, porque, apesar de terem sistemas de mecânicas tão diferentes, os dois trabalham com igual habilidade a questão de oferecer mecânicas com diferentes níveis e, assim, aproximar jogadores de diferentes perfis. Aliás, os dois até têm uma mecânica parecida, que é a de usar um personagem companheiro para alcançar alguns objetos distantes para conseguir algo. Em Child of Light, quem faz isso é o Igniculus; em Puppeteer, é o gato Yin Yang e a princesa Pikarina.

Apesar dessas semelhanças que eu listei, há um fator importantíssimo que afasta esses dois jogos, a ponto de eles irem parar em pontas extremas: esse fator é o tom que as histórias dos dois jogos assumem. Enquanto Child of Light é uma história com um universo muito triste e algo opressivo, que contrasta fortemente com a beleza visual que ele oferece, Puppeteer é um jogo claramente voltado para o humor, e tudo nele trabalha para essa ideia de criar algo fortemente carismático e capaz de entreter.

Para conseguir esse efeito, Puppeteer usa uma série de elementos que são voltados para criar um universo muito vibrante, variado e rico, mas que não demonstra grandes pretensões. O primeiro que eu queria destacar é a estética do jogo, que busca mimetizar aqueles clássicos teatros de marionetes, que talvez não sejam tão populares hoje, mas marcaram a infância de muita gente.

Tudo ali parece ser de madeira e papel, o que dá uma ideia de fragilidade e de trabalho manual como a gente só encontra hoje em jogos como Little Big Planet e Tearaway. Essa fragilidade que o visual exprime é complementada com cores sempre fortes e marcantes, como se o jogo quisesse dizer que a experiência é algo infantil, que passa rápido, mas que tem força para ficar na memória. É uma estética muito agradável e que prende a atenção do jogador.

Para além dessa opção estética, os temas dos cenários também se destacam muito em Puppeteer: praticamente todas as fases apresentam um cenário diferente e a variedade é estonteante, a ponto de o jogador não saber em que cenário Kutaro estará na próxima fase. Ele pode estar num templo japonês numa fase, e depois passar para um floresta densa em seguida, e terminar na cauda de uma cobra gigante depois.

Cada um desses cenários é criado com muito cuidado, e oferece pequenos detalhes que deixam o jogador maravilhado, seja com as mais criativas escolhas de objetos para serem cabeças, seja com as referências a obras mundialmente conhecidas, como Piratas do Caribe, O estranho mundo de Jack, Beetlejuice, A pequena sereia, Alice no País das Maravilhas, e vários outros.

O mais legal dessas variações é que elas conseguem ser bem executas sem soarem estranhas e alheias à proposta principal, o que é um risco com tantos cenários variados. Puppeteer consegue usar suas mecânicas tradicionais de diversas formas conforme o contexto, e consegue criar variações com simplicidade e de forma natural, o que dá à aventura de Kutaro um tom de épico sem precisar apresentar novas mecânicas a cada momento.

Aliás, graças a isso, Puppeteer me lembrou muito de Conker’s Bad Fur Day, um grande jogo do Nintendo 64 que conseguia também aliar viagens aos mais diferentes cenários sem complicar demais as mecânicas e dar à experiência bastante humor, embora em Conker’s o humor fosse muito mais agressivo do que qualquer coisa que Puppeteer apresenta.

Comparar esses dois jogos, entretanto, me faz pensar que um elemento interessante do humor deles seja justamente a capacidade de passar em velocidade por vários temas, o que dá um tom de novidade às brincadeiras, mas sem precisar renovar as mecânicas. É um jeito bem simples de oferecer variedade e que mantém o clima leve do jogo.

No entanto, aquilo que eu acho realmente fundamental na estrutura de Puppeteer, e que é o verdadeiro brilho dele, é a interação dos personagens. Todos os personagens do jogo mantêm tensões uns com os outros; eles estão sempre brigando por algum motivo: o gato com a bruxa, a bruxa com a Pikarina, a Pikarina com o Kutaro, e isso sem contar todas as tensões que acontecem entre os vilões. Nem o narrador do jogo fica livre disso, e frequentemente se mete em pequenas discussões com os personagens. Até o Kutaro, que não fala, acaba tendo uma presença que revela certa tensão com as ações da trama.

O fato é que os personagens de Puppeteer estão sempre se movendo para o bem comum, mas eles têm pequenas falhas que fazem deles mais humanos e próximos do jogador. Eles têm pequenos defeitos que os tornam divertidos, mas que não os apequenam, já que eles conseguem executar grandes feitos. Mas, independente do seu estatuto heroico, é difícil ignorar que o Kutaro é covarde, a Pikarina é orgulhosa demais, a bruxa é gananciosa, o gato é sarcástico, o narrador às vezes parece colocar seus interesses e antipatias à frente do que está efetivamente acontecendo, etc.

Por conta disso, cada minuto de Puppeteer é como acompanhar uma família que se ama, mas que briga desesperadamente toda vez que se encontra; é uma discussão sem fim, com tantas personalidades conflitantes, mas que sabem trabalhar juntas para um bem maior. E, enquanto fazem isso, proporcionam várias risadas ao jogador.


Com isso, eu acho que Puppeteer alcança um feito bastante raro nos jogos, que é criar um tom de comédia bastante leve e marcante, baseado na interação de diversos personagens, e não só de um ou dois. Isso dita o tom divertido do jogo a todo momento, e é complementado com bastante capricho pela estética e pela jogabilidade, tornando Puppeteer uma experiência genuinamente agradável e capaz de entreter.

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