Olá!
Bem-vindo ao canal TheAsaGames! Eu sou o Asa e hoje vou falar de Gravity Rush, jogo lançado em 2012 para
PS Vita pelo Japan Studio da Sony. Ele é um jogo que cria uma das experiências
mais divertidas e libertadoras que eu já vi num jogo, e, por isso, mostra
diversas oportunidades a serem aproveitadas pela nossa indústria.
Gravity Rush conta a história de Kat,
uma mutante com amnésia que cai de algum lugar e acorda em Hekseville, uma
cidade que está sendo ataca por monstros e sofrendo uma crise de gravidade, e
acaba sendo despedaçada. No meio da confusão, Kat conhece Dusty, um gato que
lhe dá o poder de alterar o eixo da gravidade em volta de si. Com isso, ela se
põe a ajudar os cidadãos de Hekseville a reconstruir sua cidade, o que inclui
recuperar as partes que se despedaçaram e se perderam.
Esteticamente
falando, a história de Gravity Rush é
contada como uma HQ, o que dá um ar bastante distinto ao jogo, e se deve
provavelmente à falta de potencial do Vita para armazenar cutscenes. Para além de limitações técnicas, o estilo é bastante
agradável, com o desenho em 2D extremamente bem feito, com cores fortes que
chamam muito a atenção na tela do Vita. Aliás, praticamente todos os diálogos
do jogo se dão com imagens em 2D, o que não é problema, e, na verdade,
contribuem para demonstrar as reações dos personagens, especialmente da Kat.
A
história de Gravity Rush é, talvez, a
parte mais questionável do jogo, simplesmente porque ela deixa um número
absurdo de pontas soltas, explicitando que os desenvolvedores tinham uma
sequência em mente. Por conta disso, 80% do que realmente importa no
desenvolvimento da trama acaba não sendo resolvido ou explicado, e acaba
ficando jogado no ar. O jogo, em termos de trama, se apresenta apenas como um
capítulo de uma obra, que um dia pode ser resolvido, caso haja uma sequência.
Isso
é uma coisa realmente triste que acontece na nossa indústria, e que, na
verdade, também já tem aparecido no cinema há algum tempo. É claro que obras
podem ter interligações e criar um todo maior, formado por diversos títulos
independentes, mas acho que o essencial é justamente essa independência da
obra, essa resolução interna que ela poderia oferecer. Se ela é capaz de criar
isso, ela se torna muito mais orgânica.
Como
está, Gravity Rush não parece
orgânico e não dá a sensação de um fechamento, e sim de abertura para uma
continuação. O jogador não vê sequer a resolução das duas questões mais básicas
apresentadas nos primeiros minutos do jogo, que são “qual é o passado da Kat” e
“o que tem causado as tempestades de gravidade e o ataque dos monstros Nevi”.
Tudo
isso fica um pouco mais dolorido por conta da genuína habilidade do jogo de
fazer com que o jogador se interesse pelos personagens e pelos diversos
mistérios apresentados. A Kat é um personagem bem divertido e inocente, o que
faz o jogador simpatizar com ela e se importar com o seu destino.
Além
disso, os personagens mais enigmáticos são justamente aqueles que sabem apelar
mais para o humor, então é sempre uma experiência divertida tê-los por perto,
ao mesmo tempo em que se tenta coletar mais pistas sobre a natureza desses
personagens. Por conta disso, em termos de roteiro, Gravity Rush é extremamente promissor, mas é uma pena que confie
tanto na existência de uma sequência, que, nos dias de hoje, especialmente no
que toca o PS Vita, poderia sequer existir. Seria melhor oferecer já no jogo
uma resolução interna, pelo menos das questões mais imediatas da trama.
Além
do roteiro promissor, Gravity Rush
apresenta um visual baseado em cel
shading, deixando o jogo com uma cara de desenho, que é bastante agradável
e deixa a sua marca na história dos jogos, porque eu nunca vi nada parecido. É
claro que essa técnica já é bastante conhecida dos jogadores, e foi usada com
muita frequência nessa geração de jogos, mas Gravity Rush usa o cel
shading com uma seleção de cores bastante peculiar, o que fornece uma
estética totalmente única, com uns tons verdes e avermelhados. É muito bonito e
cria uma identidade única ao jogo.
O
mesmo vale para a música. As trilhas sonoras do jogo são excelentes, oferecendo
também uma variedade bastante apreciável. Ouvindo as diversas músicas, eu me
lembrei bastante da trilha sonora de Ni
no Kuni, porque os dois jogos têm toadas muito variadas e que soam, ao
mesmo tempo, épicas, divertidas e até relaxantes.
Mas,
apesar de tantas coisas excelentes integrando o todo do game, o verdadeiro forte de Gravity
Rush é a sua jogabilidade, que se baseia na habilidade de mudar o eixo da
gravidade. Com ela, o jogador pode aderir à superfície que quiser, independente
se é uma parede ou o teto de alguma construção, além de, é claro, poder cruzar
grandes distâncias bem rapidamente.
Essa
habilidade não seria nada muito interessante se não fosse o level design bastante específico de Gravity Rush, que complementa o jogo à
perfeição. A cidade de Hekseville se apresenta como um mundo praticamente
aberto. A cidade é dividida em diversas partes, que são as que você resgata ao
longo do jogo, mas cada segmento é aberto para explorar livremente.
É
nada menos do que inacreditável o fato de os desenvolvedores conseguirem
colocar um mundo aberto tão grande e tão bonito num jogo de portátil. É claro
que ele não é extremamente povoado, e não há diversas coisas acontecendo, mas a
vastidão do cenário é algo assustador para uma plataforma como o Vita e permite
que o jogador se perca completamente, especialmente nos segmentos maiores.
Mas,
é claro que esse level design não
complementaria o jogo se ele fosse apenas horizontal. As cidades de Gravity Rush tem um dos maiores
componentes verticais que eu já vi em um jogo de mundo aberto. Em alguns casos,
atravessar a cidade verticalmente demora quase tanto tempo quanto fazê-lo
horizontalmente. A cidade é cheia de níveis, que vão da superfície povoada por
prédios, até a parte dos esgotos, que fica muito abaixo, terminando nas bases
da cidade, que ficam ainda mais nas profundezas.
Em
termos práticos, a mistura desse level
design com as habilidades da Kat fazem de Gravity Rush uma mistura dos elementos de um mundo aberto enorme,
como nós conhecemos em jogos das gerações do PS2 e PS3, com a exploração
realmente tridimensional de um jogo como Portal.
Com
isso, Gravity Rush se torna, para
mim, o jogo em que o conceito de mundo aberto é mais plenamente realizado, no
sentido em que ele oferece ao jogador, ao apertar dois botões, a possibilidade
de um eixo que é muito pouco aproveitado pelos jogos do gênero, que é o eixo
vertical. É algo totalmente inovador e dá uma experiência de liberdade sem
igual num jogo, e eu poderia ficar viajando sem destino por um bom tempo, só
explorando os detalhes da cidade, vendo o que se esconde nas suas mais diversas
partes e meandros.
Talvez
a falta de jogos com a ambição e o radicalismo de Gravity Rush se deva ao foco que nossa indústria tem no estilo
realista, mesmo quando o jogo é significativamente descolado da realidade. Um
exemplo é Batman: Arkham City, que é
um game sobre um herói de quadrinhos,
e tem um mapa enorme em termos horizontais, e até explora a verticalidade dos
arranha-céus da cidade, mas não tem a riqueza vertical de Gravity Rush, porque o chão tem que ser o limite num mundo
realista.
Nesse
sentido, Gravity Rush deixa uma lição
interessante, que é o poder de libertar-se desse estilo realista. Libertando o
jogo das rédeas da realidade e criando um mundo totalmente novo, é possível
criar experiências radicais e marcantes. É como se a liberdade dos
desenvolvedores em criar aquele mundo se transmitisse na experiência do
jogador. É como uma crítica não intencional ao paradigma realista que rege
nossa indústria.
Uma
escolha perigosa de Gravity Rush, e
que poderia trabalhar contra a proposta de liberdade, é que a imensa maioria
das missões principais e dos desafios, que são basicamente todas as missões do
jogo, fica na superfície, o que poderia tirar um pouco o incentivo de conhecer
a cidade em todas as suas dimensões. Entretanto, os cristais, que são a moeda
de troca do jogo para upgrades, ficam espalhados pela cidade toda, e
procurá-los é sempre divertido. Além disso, como eles são visíveis em grandes
distâncias, eles incentivam o jogador a conhecer locais diferentes e explorar o
mapa ao máximo.
Quando
o jogador não está explorando o mundo de Gravity
Rush, ele está envolvido ou nos desafios de corrida ou nos combates. As
corridas são divertidas e oferecem diferentes recompensas conforme o desempenho
do jogador. Elas são bem divertidas, fazem uso interessante das mecânicas
próprias do Vita, mas são, talvez, o momento menos interessante do jogo, justamente
por causa do pouco tempo e dos limites espaciais do desafio.
Já
os combates têm suas qualidades e defeitos. A principal qualidade é a
capacidade de usar os poderes de gravidade enquanto a Kat luta, o que possibilita
desviar com velocidade, atacar de formas diferentes e até criar rotas de fuga
totalmente não usuais, como sair voando para longe. Tudo isso pode ser feito
com rapidez, já que os poderes de gravidade são acionados com apenas dois
botões: o primeiro suspende a Kat no ar enquanto o jogador decide a nova
direção do eixo de gravidade, e o segundo ativa a gravidade novamente. Se o
jogador já domina as mecânicas, isso pode ser feito em pouquíssimos segundos.
O
grande problema dos combates só aparece num estágio um pouco mais avançado do
jogo, quando começam a predominar os inimigos que se movimentam sem parar. É
muito difícil mirar neles para desferir o ataque que usa gravidade e, mesmo
quando se acerta, um movimento de última hora da parte do monstro pode fazer a
Kat deslizar ao lado do ponto fraco em vez de acertar, o que pode ser bem
frustrante. Seria algo a melhorar nesse combate que, com exceção desse aspecto,
funciona tão bem e reproduz com perfeição a mecânica do jogo.
Gravity Rush apresenta uma das mecânicas
mais interessantes em jogos 3D e cria a experiência de mundo aberto mais
radical que eu já vi. É um jogo marcante, que dá uma lição de liberdade de
pensamento no momento de desenvolver um game,
e resulta numa liberdade muito interessante para o jogador.
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