sábado, 23 de janeiro de 2016

Mortal Kombat (2011) - Pensando sobre o jogo



Olá! Bem-vindo ao canal TheAsaGames! Eu sou o Asa e hoje vou falar de Mortal Kombat 9, ou simplesmente Mortal Kombat, jogo lançado em 2011, desenvolvido pela Netherrealm Studios e publicado pela Warner Bros. Eu não pretendo falar do jogo por inteiro, até porque há muito conteúdo nele, uma infinidade de opções entre modo arcade, torre dos desafios, multiplayer, etc.

Neste vídeo, eu gostaria de focar o modo história, pelo qual o jogo foi bastante elogiado na época do seu lançamento, e que se tornou uma espécie de exemplo de que jogos de luta podem ter narrativas sólidas em sua estrutura, e não apenas um argumento básico que explique por que aquele grupo de lutadores se reuniu. Em relação ao modo história, Mortal Kombat se tornou algo fora do normal mesmo, e um exemplo de ousadia profunda e de reinvenção do seu mito original, ainda que você não vá encontrar nenhuma complexidade absurda nessa narrativa.

A história de Mortal Kombat começa com Raiden, o deus do trovão, perdendo sua luta definitiva contra Shao Kahn, num momento em que todos os outros lutadores daquele universo se encontram mortos. A derrota dele significa que o reino da Terra finalmente será absorvido por Outworld, o reino do Shao Kahn. Entretanto, num último movimento, Raiden usa suas forças para mandar um enigmático recado para seu eu do passado, e isso nos leva ao início do primeiro jogo da série Mortal Kombat.

Para começar, esse é um movimento muito inteligente e coerente com tudo que vai acontecer daí por diante. Nesse modo, nós vamos passar pela história dos três primeiros jogos da série, mas de uma forma nova, graças a esse elemento novo, que é a tentativa do Raiden de entender a mensagem e as visões que ele recebe. Além disso, em termos de jogabilidade, retornar aos primeiros episódios faz com que um retorno à estrutura 2D não seja algo estranho ou anormal àquele universo, e permite uma modernização gráfica de um cenário consagrado.

Modernização é a palavra que vai definir todo o processo executado no modo história de Mortal Kombat, e isso é visto da melhor forma no trabalho com os personagens. Para entender isso, eu preciso fazer uma breve regressão. Nos três primeiros jogos da série, era muito difícil você detectar uma trama sólida ou muitos detalhes sobre o enredo. O jogo não apresentava um modo história ou uma explicação obrigatória a quem quisesse jogar.

Quando você pegava um cartucho de Mortal Kombat, ou então jogava num fliperama, você ia diretamente para a tela de opções e, em seguida, para a seleção de personagens. Conhecer a história dos personagens requeria que você não jogasse, que esperasse até as informações aparecerem. Isso, obviamente, vai completamente contra o instinto normal do jogador, então poucos acabavam sabendo de qualquer elemento prévio.

Além disso, finalizar um jogo naquela época era bem difícil e requeria habilidade extrema. Até hoje, por exemplo, eu não consegui finalizar Mortal Kombat 2, porque o Kintaro não me deixa, mesmo na dificuldade mais fácil. Só com emuladores foi possível. E, mesmo que eu tivesse conseguido zerar, teria sido apenas com um ou outro personagem; dificilmente eu terminaria com todos. Por tudo isso, o texto que aparecia ao zerar com um dos personagens era desconhecido por muita gente; menos pessoas ainda conheciam os textos de todos eles. A saída mais prática era o manual do jogo, mas quem jogava nos fliperamas não tinham essa opção, sem contar a turma que alugava o cartucho.

Assim, a forma mais frequente de conhecer os personagens e entender sua identidade era através do jogo em si, das lutas. Mortal Kombat, a exemplo de Street Fighter II, criou personagens com poderes variados e únicos, que permitissem que cada lutador fosse muito diferente do outro. Graças a isso, nós sabemos a diferença entre Scorpion, Sub-Zero, Reptile, Rain, Ermac, Smoke e Noob Saibot, apesar de eles serem meramente ninjas com cores diferentes.

Agora, para além do que o jogo da Capcom apresentava, Mortal Kombat trouxe os fatalities, os movimentos de finalização que são a marca da franquia. Graças a eles, os personagens ganharam uma identidade muito mais forte. O Liu Kang era o lutador que soltava fogo e dava gritinhos, mas ele era aquele que virava um dragão e comia o adversário no fatality. O Scorpion ficou para sempre conhecido pela fala dele ao agarrar o inimigo com a corda, mas é também aquele personagem que vira uma caveira e queima o inimigo vivo.

Conforme os jogos da série foram se seguindo, os fatalities deixaram de ser uma apelação violenta do jogo, e se tornaram uma marca dos personagens, o que permitiu que os desenvolvedores acrescentassem também humor com os friendships e até em alguns fatalities, como o do Smoke robô, em que ele explode o mundo inteiro, incluindo a si mesmo.

Essas animações criaram a atmosfera típica de um jogo da série Mortal Kombat e contaram mais sobre os personagens do que qualquer texto que pudesse aparecer antes do jogo começar ou no final. E é por isso que esses personagens têm fãs, apesar de, num primeiro momento, parecerem apenas cópias de atores famosos e ninjas. A identidade deles estava na forma como lutavam e como matavam seus inimigos.

O modo história de Mortal Kombat 9 retoma esses mesmos personagens, e vários dos golpes que povoaram a consciência de um fã da série: estão lá as habilidades congelantes do Sub-Zero, o chute rápido do Johnny Cage, a voadora e o fogo do Liu Kang, as transformações do Shang Tsung, as provocações do Shao Kahn, os gritos malucos do Raiden, a corda do Scorpion com sua fala já famosa, e muito mais.

O que mudou é que agora há espaço no disco para acrescentar uma história decente, e há conteúdo suficiente no jogo para que esse modo história seja sumariamente ignorado por quem não quiser saber dele. E, com isso, o jogo pode expandir seu conceito, o que não é difícil, visto que muito do caráter dos personagens seguia inexplorado até aquele momento.

Foi assim que o jogo conseguiu dar identidades novas aos personagens. Johnny Cage ganhou uma aura divertida e se tornou um dos personagens mais carismáticos da história, aquele que sempre tem algo a dizer, no geral algo engraçado. A relação entre os irmãos Sub-Zero ficou mais explícita e trágica; Cyrax e Sektor ganharam formas humanas que deram uma significação totalmente distinta à sua transformação em robôs. São muitos os elementos acrescentados.

A melhor forma de fazer esse trabalho narrativo era dar a cada personagem a chance de falar por si, de mostrar quem é, e isso foi feito com bastante maestria com a ideia de dividir o jogo em vários capítulos, sendo cada um protagonizado por um personagem do jogo. Infelizmente, não foi possível que todos os personagens tivessem seu capítulo, mas houve uma cobertura bastante sólida do grupo.

Alguns desses capítulos têm lutas que parecem forçadas e tolas, mas eu não achei nenhuma delas deslocada em relação à história, no máximo elas surgem como uma explosão exagerada de uma tensão que estava originalmente na situação inicial.

Por exemplo, logo no primeiro capítulo, do Johnny Cage, ele começa a dar em cima da Sônia, até que ela se irrita e dá um soco nele. Eles, então, começam a lutar, e só no final da luta ele percebe que se empolgou demais e acabou batendo nela. Foi uma reação exagerada; talvez, numa situação mais plausível, ele só desse um golpe nela, mas a luta aconteceu num contexto coerente com a existência dela; nada foi inventado aí.

Dentro desse vasto processo de reelaboração dos personagens, o que ganha mais é o Raiden, que a gente pode chamar de protagonista do jogo. Ele ganha espaço para mostrar suas crenças e suas contradições e seu personagem ganha bastante conforme a história avança. Além disso, a trama dele cria um ar de novidade grande na cabeça do jogador, que revisita constantemente suas memórias sobre Mortal Kombat, tentando também adivinhar o que a misteriosa mensagem do futuro significa.

E o fato de nós não sabermos o que significa é o que dá o ar de herói trágico ao Raiden, que luta no escuro, sem ter a menor ideia da consequência dos seus atos, ignorando respostas simples para fugir do que ele pode fazer de errado. E, como nós não sabemos também o caminho certo, acompanhamos com muito interesse. E, como nós sabemos o caminho errado, ficamos muito curiosos ao ver qualquer desvio do caminho.

Por conta disso, uma história antiga e pouco complexa se renova, justamente porque nós a conhecemos em alguma medida: nós queremos ver como ela será reescrita. Mas, diferente do que se podia esperar, não se trata propriamente de um remake. Trata-se de uma continuação, que progride justamente indo para trás, em vez de inventar algum inseguro e fraco caminho para frente.

Num tempo em que sequências sem fim são lançadas só pelo renome ou por alguma pressão mal direcionada da parte do público, a história de Mortal Kombat é quase revolucionária. Em termos de substância, a história é divertida e entretém com personagens razoáveis, mas não é genial. Entretanto, seu lugar na franquia e na indústria representa uma forma incrível de a série se renovar, deixando relativamente para lá toda a história trilhada até então e podendo começar um novo segmento, uma narrativa interessante.

Em todo esse processo, destaca-se a coragem que a equipe teve de eliminar muitos personagens clássicos e favoritos dos fãs. Sem entrar necessariamente em spoilers, vale dizer apenas que muitos personagens da trama acabam morrendo conforme a história progride, e que é possível que eles tenham sido sepultados para sempre na franquia, até porque, além de haver essas mortes, já foi divulgado que o próximo jogo da série se passará após um significativo salto temporal.

A série está indo para onde quer ir, e o impulso de manter os personagens antigos só para agradar fãs não parece ser uma preocupação grande. É como se a Netherrealm voltasse ao passado apenas para revê-lo, liquidá-lo e seguir em frente, como uma narrativa de fato deve fazer.

Assim, o modo história de Mortal Kombat 9 fornece grandes lições para a indústria de hoje: revisitar o passado vale a pena somente se o resultado for enriquecedor para o material de base e para a relevância daquela série hoje; e franquias devem saber trabalhar seu material narrativo sem medo, buscando sempre o melhor resultado possível dentro da obra em questão, e não pensando no futuro indefinido da série e nas possibilidades de lucro que ela ainda pode dar.

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