segunda-feira, 25 de janeiro de 2016

Shovel Knight - Pensando sobre o jogo



Olá! Bem-vindo ao canal TheAsaGames! Eu sou o Asa e hoje vou falar de Shovel Knight, jogo da Yacht Club, lançado em 2014 para PC, Wii U e 3DS, e em 2015 para PS4, PS3, PS Vita e Xbox One. Ele é um excelente jogo que faz um magnífico trabalho de retomar a estética e o design de jogos do passado, mas criando uma identidade bastante única e bem aceitável para o público de hoje.

Shovel Knight conta a história do personagem com esse mesmo nome, um cavaleiro conhecido por usar apenas uma pá como arma, que, junto com sua companheira Shield Knight, tinham as maiores glórias do reino. Num certo dia, entretanto, os dois resolveram explorar uma torre, e um amuleto acaba selando a Shield Knight na torre e trancando o Shovel Knight fora dela.

Ele, então, se aposenta, até ouvir falar que uma feiticeira abriu novamente a torre. Ele resolve partir, mas, para chegar até a torre, ele precisa derrotar oito fiéis cavaleiros da feiticeira, que estiveram aterrorizando o reino até então. É uma história bem simples, mas que retoma bastante as premissas bem básicas que os jogos da época do NES propunham.

Acho que a primeira coisa que dá para analisar quando a gente tenta entender Shovel Knight é justamente o protagonista. Visualmente, ele já denuncia muito o tom do jogo. Ele é um cavaleiro com um estilo medieval, mas talvez um pouco baixo demais, mais ou menos do tamanho das crianças que ele encontra na história. Ou seja, ele tem um papel nobre, que é salvar aquele mundo, mas a envergadura dele sugere uma pessoa abaixo do normal.

Mas, não é só isso: ele é um cavaleiro que usa uma pá para combater. É uma ferramenta que ninguém considera como arma, e em vários momentos ele não é levado a sério justamente por isso. Por conta dessas coisas, já de cara a gente consegue perceber que Shovel Knight é um jogo que, apesar de ter uma premissa mais ou menos séria, tem uma forte pitada de humor e de descontração.

Eu acho que isso é uma das coisas que mais diferencia Shovel Knight do resto, e é algo que estranhamente não aparece tanto em jogos com um estilo retrô, já que era normal que os próprios jogos antigos não se levassem tanto a sério, mesmo que às vezes eles tivessem que lidar com gente que não entendia isso.

Em termos de jogabilidade, Shovel Knight é uma mistura de uma série de propostas adotadas em vários outros jogos da época do NES, mas com ligeiras modificações. A movimentação e o level design são herdeiros claros de Mega Man, embora o tipo de combate de Shovel Knight, com golpes horizontais e baseado em proximidade, acaba distanciando um pouco os dois jogos.

O que mais aproxima Mega Man e Shovel Knight, entretanto, é a estrutura dos chefes, que são temáticos, ficam localizados em fases que seguem esse mesmo tema, e apresentam estruturas de ataque que variam bastante. Mas, se afastando dos jogos do passado, em Shovel Knight, os chefes acrescentam novos ataques às suas possibilidades conforme a batalha evolui. A primeira vez que você batalha contra um chefe é sempre cheia de surpresas.

Já a mecânica de usar a pá para atacar verticalmente e atravessar alguns obstáculos vem de Duck Tales, como também o foco do jogo em coletar diversas riquezas. Entretanto, enquanto Duck Tales fazia isso apenas para honrar o personagem e dar um foco na pontuação do jogador, Shovel Knight usa a mecânica de coletar joias também para comprar upgrades e ferramentas especiais.

Mas, não é só isso. O dinheiro, em Shovel Knight, é usado como uma inteligentíssima ferramenta para modernizar o design do jogo, deixando o desafio ainda bem acentuado. Quando o jogador morre em Shovel Knight, ele deixa uma parte significativa do seu ouro no lugar onde morreu, e tem a chance de recuperá-lo se conseguir coletá-lo antes de morrer novamente. É obviamente uma mecânica adaptada de Dark Souls.

O interessante, com isso, é que o jogo remove a necessidade de uma situação de perda total, de game over, e a substitui por derrotas menores, mas significativas, já que perder dinheiro significa não poder aumentar nenhum dos seus status ou não poder comprar nenhum item novo.

Hoje já é bem sabido que situações de perda total de progresso antigamente eram usadas para fazer o jogador gastar mais dinheiro em fliperamas, ou então para estender a duração de um jogo curto. Conforme o tempo passou, a política de design mudou e a vontade de evoluir no jogo acabou substituindo esse princípio de desafio.

Shovel Knight consegue a incrível façanha de deixar esses dois paradigmas de design coexistirem. Ele não bloqueia o jogador de avançar, e não apresenta game over se houver muitas mortes, mas ele oferece um desafio que fala diretamente ao jogador e àquilo que o próprio jogo ensinou a valorizar, ou seja, o dinheiro. Chegar no final de uma fase com muito dinheiro é a marca de que o jogador é habilidoso e capaz de passar pelo mais difíceis trechos sem morrer, e, além disso, possibilita evoluir e aproveitar o jogo de outras formas, com outras ferramentas. São as duas motivações, do passado e do presente, unidas.

E, para os fãs nostálgicos que ainda acham isso pouco, Shovel Knight oferece uma política única de checkpoints. Toda fase do jogo tem diversos checkpoints, que ajudam muito caso o jogador esteja travado numa parte e não queira ficar voltando. Mas, se o jogador assim quiser, ele pode destruir os checkpoints, que se convertem em dinheiro. Assim, passar pelas diversas fases acaba sendo tão difícil quanto o jogador quiser que seja. E andar numa fase sem checkpoints e cheio de dinheiro é uma tensão bem grande.

Como eu já disse, o dinheiro no jogo é usado para comprar upgrades e ferramentas novas. Por conta disso, o jogo acaba sendo tão difícil como o jogador quiser, porque ele não é obrigado a comprar nada, o que permite que a dificuldade seja ajustável em detalhes pelo jogador enquanto ele joga.

As ferramentas que o jogador pode comprar funcionam de um jeito ainda mais interessante. Na prática, elas facilitam muito o trajeto do Shovel Knight, porque eliminam uma série de fraquezas: elas podem ser úteis para alcançar certos locais, passar por trechos com muitos inimigos, atacar de longe, etc. Como eu disse, nenhuma delas é essencial, mas elas fazem o jogo funcionar de forma tão diferente que acabam sendo bem divertidas de usar. Mas, é preciso moderação, porque elas consomem magia.

O que é ainda mais interessante sobre as ferramentas é que elas ficam bem escondidas nas fases, e é preciso conhecer um pouco os sinais que o jogo deixa para poder chegar até elas. E isso sem contar, claro, que os trechos em que elas estão são alguns dos mais difíceis da fase, e o jogador precisa chegar lá com um bom dinheiro se quiser comprar o item na hora.

Isso cria uma dinâmica bem interessante, no sentido de que, em teoria, essas ferramentas (chamadas de relíquias no jogo) tornam o jogo mais fácil, mas, para pegá-las, você precisa demonstrar uma considerável habilidade. É como se o jogo tivesse total consciência das suas possibilidades e, em vez de escolher a que melhor cabe a ele, acaba fazendo tudo coexistir com uma surpreendente habilidade e coerência.

Voltando a falar de influências, a gente ainda pode perceber que a estrutura de navegação do mapa do jogo vem direto de Super Mario Bros. 3, com o jogador podendo escolher rotas e inimigos para enfrentar, além de eventos surpresa, como reedições de fases com mais dinheiro ou um inimigo secreto.

A estrutura das cidades é bastante parecida com Zelda 2, ou seja, em 2D e cheia de pessoas caminhando. O mais legal, entretanto, é que Shovel Knight dá uma vida totalmente nova a essa estrutura de cidade, populando cada local com personagens divertidos e cheios de coisas para dizer.

Nesse sentido, Shovel Knight é um jogo com excepcional capacidade de conferir charme a estruturas bem simples do passado, que, por limitações técnicas, dificilmente passavam de uma representação de uma mecânica. Agora, os personagens deixam de ser só veículos para evoluir, e se tornam figuras conhecidas, com quem é bem mais divertido interagir.

E eu acho que nada reflete melhor essa capacidade do jogo de conferir charme a estruturas simples do que a história. Como eu já disse, a premissa de Shovel Knight é bem simples, mas, durante o jogo, diversos momentos são usados para desenvolver a trama e eles acabam desenvolvendo mais os personagens do que seria de se esperar.

A primeira coisa que se destaca nesse sentido são os sonhos do Shovel Knight, que, na prática, são fases bônus, em que o jogador mata vários inimigos para pegar mais dinheiro, mas, enquanto isso, a Shield Knight está caindo e é preciso pegá-la, o que representa bastante a falta que o Shovel Knight sente da sua companheira e a culpa de não ter conseguido salvá-la.

Além disso, logo no início, o jogo nos apresenta o Black Knight, que é uma espécie de espelho das habilidades do Shovel Knight, e que efetivamente funciona como um rival do protagonista em diversos aspectos, e que tem um desenvolvimento bem interessante dentro da trama, não se limitando a ser uma batalha extra contra uma figura com iguais habilidades.

Por fim, a batalha final do jogo, que eu não vou spoilar aqui, é um momento muito interessante, porque consegue despertar, em termos de jogabilidade, um sentimento de união e de companheirismo que, de alguma forma, o jogo até tenta contar, mas que se torna muito mais efetivo quando transferido para o gameplay. E, com isso, o final do jogo, que é bastante conciso e sutil, consegue dar uma identidade forte aos três personagens principais da história e à relação deles. E tudo com muita elegância.

E são estas coisas que eu acho que tornam Shovel Knight algo tão especial: muita gente aponta que ele funciona como os melhores jogos da época do NES. E, de fato, ele sabe retomar algumas das melhores mecânicas dos jogos mais consagrados daquela época, além de retomar a estética visual e a excelência na trilha sonora, mas Shovel Knight é muito mais do que um jogo que parece ter saído de um túnel do tempo.

Shovel Knight tem a capacidade de unir fortemente ao estilo de design do passado muitas das conquistas que os jogos fizeram até hoje, como um trabalho inteligente na construção dos personagens e da história, e a inserção de mecânicas que podem agradar aos mais diversos públicos, mas sem parecer algo deslocado dentro da proposta do jogo. É um jogo que corajosamente declara que quer o melhor que cada época pode oferecer, e isso faz do jogo uma experiência incrível.

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