Olá!
Bem-vindo ao canal TheAsaGames! Eu sou o Asa e hoje vou falar de Hotline Miami 2, jogo da Dennaton Games,
lançado neste mês para PC, PS4, PS3 e PS Vita. Quem acompanha este canal mais
de perto deve lembrar que eu já fiz a análise do primeiro Hotline Miami, e que ele é um dos jogos indie mais bem realizados em termos de criar uma experiência única,
que coordena todas as suas partes para gerar um determinado efeito.
Neste
vídeo, eu vou fazer várias menções ao que eu disse sobre o primeiro Hotline Miami e, por isso, eu recomendo,
para quem quiser entender melhor tudo que vai ser dito aqui, que veja antes o
vídeo do primeiro jogo. O endereço está na descrição do vídeo. Dito isso, vamos
lá.
A
impressão que eu tive ao jogar Hotline
Miami 2 é que os próprios desenvolvedores sabiam que mexer muito na fórmula
do primeiro jogo seria um erro sério, já que ela é tão bem realizada. Por isso,
o trabalho maior deles foi direcionado em criar ajustes que fizessem o jogo
parecer muito o original, ao mesmo tempo em que poderiam criar situações únicas
dentro daquele paradigma.
Assim,
Hotline Miami 2 é também um shooter 2D visto de cima, em que o
jogador controla um personagem que entra num certo prédio e precisa sair
neutralizando todos em seu caminho para progredir. A estética visual continua
altamente influenciada por um tom meio anos 80, com cores muito fortes e
contrastantes.
E,
ao mesmo tempo em que o jogador progride na fase, ele ouve músicas eletrônicas
frenéticas e de alta qualidade, que representam o próprio tom de vida ou morte
que a mecânica do jogo impõe, com o protagonista sendo morto com quase qualquer
ataque, mas também sendo capaz de matar com apenas um ataque. É um jogo em que
apostas altas são constantes, e exige uma coordenação afiada, que beira a um
frenesi, o que representa muito o que está acontecendo no jogo.
Esses
são os fundamentos que Hotline Miami 2
herda do seu antecessor e, como tal, é uma experiência diferente de todo o
resto da indústria. A velocidade e o frenesi com que tudo acontece deixa um
jogador num transe, e é muito difícil sair. Quando eu fui gravar esta gameplay que vocês estão vendo, eu não
consegui parar num tempo que eu achei razoável, e acabei indo umas duas fases
adiante, só porque o jogo não te liberta. É um vício, e é assim que Hotline Miami sempre quis que o jogador
se sentisse.
Dito
isso, é preciso falar que houve muitas variações dentro da fórmula estabelecida
pelo primeiro jogo e, no geral, eu não acho que nenhuma delas proporcionou um
ganho real a Hotline Miami 2; na
melhor das hipóteses, houve ganhos acompanhados de perdas. Vamos tratar de cada
aspecto para entender isso.
A
primeira coisa problemática em relação ao jogo foi o esforço de expansão, que,
na verdade, é uma coisa bem frequente em termos de sequência. Quando é
anunciada uma sequência para um jogo, é bastante comum que os jogadores esperem
que o novo jogo seja maior, mais ambicioso e amplo do que o original. Em Hotline Miami 2, esse esforço vem,
principalmente, em dois elementos: no número de fases, e no design dos cenários.
O
número de fases acaba influenciando no tempo de zeramento do jogo, que
realmente é maior do que o do primeiro Hotline
Miami. Eu acho que isso não influencia muita coisa, porque o jogo, em si,
ainda é construído em cima de cenários bem delimitados e contínuos, e só joga
por longos períodos quem quiser. Eu não detectei nenhum filler no meio do caminho.
Já
no que se refere ao design dos
cenários, foi criado um problema sério. Como eu falei e vários fãs sabem, em Hotline Miami 2, um tiro ou um golpe
pode matar instantaneamente. Isso exige que o jogador tenha reflexos rápidos, e
também que saiba se planejar e se adaptar às diversas situações do jogo. Para
isso, o jogo tem uma mecânica de estender o campo de visão do protagonista para
poder enxergar os inimigos que estão além. Assim, o jogador pode se movimentar
sem levar um tiro e morrer na hora, e ter que fazer toda a fase de novo.
Em
Hotline Miami 2, os cenários são
maiores do que os do primeiro jogo, mas o campo de visão permaneceu o mesmo. O
resultado disso são vários momentos em que você anda sem ter a menor ideia do
que há na sua frente, o que muitas vezes resulta em morte. O primeiro Hotline Miami não era livre de situações
como essas, mas elas eram muito menos frequentes do que na sequência. Isso é
especialmente problemático, considerando a velocidade com que os inimigos
passam do estágio de inércia para o estágio de ataque. É coisa de um segundo e
o personagem já está morto. É bem frustrante.
Eu
acredito que uma expansão mais razoável do design
dos cenários seria aumentar o número de inimigos ou o número de andares de uma
mesma fase. Como está, algumas apostas do jogador ganham uma carga de sorte que
não combina com um jogo que exige planejamento, como é Hotline Miami 2.
A
principal inovação do jogo em relação a seu antecessor é a substituição parcial
do sistema de máscaras para um sistema de personagens. No primeiro Hotline Miami, o jogador controlava um
psicopata que usava máscaras para se disfarçar, e provavelmente para assustar
alguns dos seus inimigos. Em termos de jogabilidade, a escolha de qual máscara
usar significava alguns bônus específicos, que ajudavam em determinadas fases
ou favoreciam um certo estilo de jogo.
Em
Hotline Miami 2, o jogador controla
um rol relativamente grande de personagens, e cada um desses personagens tem
características específicas, com vantagens e desvantagens em relação aos
outros. Alguns deles ainda podem escolher máscaras, mas o número é muito menor
do que no primeiro jogo. Com isso, claro, o jogo perde no fator customização.
Mas
essa mudança não é de todo má. Na prática, jogar com os diversos personagens
permite ao jogo oferecer desafios muito específicos, que não seria possível
dando tantas opções como no primeiro jogo. Assim, por exemplo, um dos
personagens só pode usar um tipo de munição e, caso ela acabe, ele precisa ir
até um ponto do cenário para recarregar. Com isso, cria-se uma interessante
dinâmica de precisar saber quando usar a faca do personagem e quando usar a
arma.
Essa
liberdade de criar personagens fixos ainda permitiu a adição mais interessante
de Hotline Miami 2, que é um
personagem duplo. Em certas fases, o jogador pode controlar simultaneamente
Alex e Ash: um usa uma pistola, e o outro, uma serra elétrica. Cada botão
controla a ação de um deles, e exige uma coordenação ainda maior e oferece
riscos interessantes, que tornam a experiência muito marcante. Seria legal usá-los
mais no jogo.
Em
contrapartida, algumas das desvantagens desses personagens soam meio toscas e
prejudicam um pouco o ritmo da experiência que o primeiro Hotline Miami estabeleceu: voltando ao caso do personagem que só
tem um tipo de munição, o conceito permite algumas coisas interessantes e novas
em termos de jogabilidade, mas a verdade é que precisar se deslocar para
conseguir munição quando existe um monte de armas jogadas no chão ao lado do
personagem é meio frustrante e incoerente.
Para
além de incoerência com a situação, há também uma certa incoerência com a
própria jogabilidade, que incentiva o jogador a improvisar, pegar várias armas
e usar o que estiver à mão. O tipo de limitação de certos personagens oferece
coisas novas, mas tira algumas das vantagens antigas que a experiência de Hotline Miami sempre teve.
Entretanto,
as mudanças mais profundas que o sistema de personagens cria estão no enredo do
jogo, e aí, antes de prosseguir, eu queria fazer um breve apontamento. O
primeiro Hotline Miami foi analisado
por algumas pessoas que eu respeito, e uma opinião bem comum que eu vi foi
gente dizendo que a narrativa do jogo era fraca, ou então apenas uma metáfora
sobre a violência em jogos. Isso foi bastante curioso para mim, porque eu
sempre vi uma narrativa muito bem definida no jogo, que encaminhava o jogador
para um certo sentimento. Se você quiser detalhes, o conteúdo está lá na minha
outra análise.
Eu
não sei quem estava certo ou errado nessa discussão, mas a verdade é que algo
nessas afirmações parece ter incomodado os desenvolvedores, porque, em Hotline Miami 2, embora sejam tratados
temas bem semelhantes aos do primeiro, houve um esforço bem maior para deixar
esses temas evidentes, com direito a um número bem maior de cutscenes, explicando várias
circunstâncias que tornam as motivações dos personagens um pouco mais claras. É
como se o pessoal da Dennaton não quisesse ver a história do seu jogo sendo
tratada como algo desimportante.
Assim,
no primeiro jogo, nós tínhamos um protagonista cujas motivações ele mesmo
desconhecia, e que vivia para matar a mando de alguém que ele nunca viu. Como
ele desconhecia tudo isso, o jogador também desconhecia, ou seja, os dois
estavam em situação semelhante. E este era o centro do primeiro Hotline Miami: fazer você criar um ponto
de identificação com um monstro, ainda que momentaneamente. A tensão das fases
e a música vibrante e frenética ajudavam a transmitir o frenesi da mente dele.
Ao
mesmo tempo, nós tínhamos também um segundo personagem, que tinha justamente o
propósito de obter respostas e só matava se fosse necessário. Como ele aparecia
ao final do jogo, é como se a experiência de Hotline Miami fosse empurrando o jogador lentamente para fora da
espiral da violência, como se a razão abandonasse o ciclo da violência da mesma
forma como o jogador abandona o jogo ao final e deixa seu instinto sanguinário
ali mesmo, no jogo.
Hotline Miami 2 segue um script muito semelhante em termos de
temática, mas opta mais por um desfile de temas do que por uma experiência
intensa e vertiginosa como o primeiro jogo. O jogo se passa em diversos
momentos, tanto antes quanto depois dos acontecimentos do primeiro jogo, e
mostra personagens que, em sua maioria, não se relacionam, mas acabam se
encontrando em breves momentos.
Para
transmitir a sensação de desconhecimento que o primeiro jogo tinha, Hotline Miami 2 coloca o jogador num
emaranhado de acontecimentos, que vão e voltam no tempo, e são protagonizados
por diferentes personagens. Em certos momentos, foi tão confuso que eu precisei
fazer um esquema num papel para ter a ideia exata de quando aconteceu o quê.
Na
história do jogo, nós temos, em sua imensa maioria, personagens violentos, que
agem como o protagonista do primeiro jogo, meio sem saber por quê, ou então com
desculpas insustentáveis, como uma raiva momentânea por uma ligação mal educada
ou simplesmente falta do que fazer.
Em
contrapartida, a história também têm personagens cansados da violência, ou simplesmente
tentando entendê-la, mas sem recair no instinto de destruição que rege os
outros personagens da série. Esses personagens tentam sobreviver nesse
turbilhão de violência, e manter a razão e a vida intacta.
Nesse
sentido, destaca-se o Evan, um escritor que está fazendo um livro sobre os
assassinos mascarados. Ele mantém a razão intacta durante o jogo e o seu gameplay é baseado em não matar ninguém.
Ele apenas nocauteia os inimigos, e isso é uma coisa muito estranha para a
realidade de Hotline Miami, porque,
de alguma forma, trai a jogabilidade insana do jogo.
Até,
então, o jogo sempre tinha a sua violência, marcada pela insanidade dos
personagens, o som frenético, a mecânica de alto dinamismo e o visual altamente
provocador para os olhos, especialmente o sangue, com um vermelho muito vivo e
brilhante. Nos segmentos do Evan, você não mata ninguém e não pode usar armas,
então as suas opções de ataque ficam limitadas, bem como o seu feedback de sucesso, que antes era
representado por aquele espetáculo de sangue ao matar alguém. Com isso, o
personagem do Evan é meio fora de lugar na experiência.
Se
você compará-lo ao Biker do primeiro Hotline
Miami, você percebe a diferença: embora o Biker não saia matando todos que
vê pela frente, ele ainda tem algo do instinto assassino do outros personagens
da série e, como eu falei, a figura um pouco mais racional dele oferece a
oportunidade de o jogador se libertar aos poucos da violência sem motivação do
primeiro protagonista.
O
Evan soa como um peixe fora d’água no mundo de Hotline Miami, a única pessoa com uma ética de não sair matando
todos que vê. É como se os desenvolvedores tivessem separado um dos elementos
do Biker e feito um personagem só com isso para tornar as coisas um pouco mais
didáticas, mais claras em termos de mensagem.
No
fim das contas, a mensagem de Hotline
Miami 2 é como a do primeiro jogo da série: a violência toca a todos, e
experimentá-la é um processo catártico, viciante e altamente recompensador aos
sentidos. Entretanto, ela é uma espiral descendente, que provavelmente não
resulta em nada de bom, e quem é tocado por ela vai precisar arcar com as
consequências.
A
grande diferença entre os dois enredos é que Hotline Miami 2 é muito mais didático, e tenta construir a história
muito mais por cutscenes e construção
de personagem do que pela jogabilidade mesmo e, no caminho, acaba até criando
alguma incongruências, como a do Evan.
Em
contrapartida, os novos personagens criam diferentes perfis, que permitem ao
jogador se identificar com diversas figuras, que ajudam a dar a ideia de que o
instinto violento pode ser despertado por diversos elementos. Mas, nesse
processo, eu acredito que foi perdido algo da experiência mais bem amarrada e
intensa do primeiro Hotline Miami.
E
era isso que eu queria dizer sobre Hotline
Miami 2. Ele é um jogo divertido e interessante, mas algo do polimento e da
intensidade do seu antecessor acabou se perdendo.
Nenhum comentário:
Postar um comentário